Desde
o seu retorno ao cinema, David O. Russell foi indicado a cinco Oscars
e emplacou pela segunda vez quatro de seus atores nas categorias
principais do grande prêmio do cinema norte-americano. Alguns por
merecimentos, outros nem tanto. Em Trapaça,
saindo um pouco de sua zona habitual de conforto, o diretor parece
insistir em uma versão própria de Os
Bons Companheiros,
de Martin Scorsese, combinando o clima cínico e a corrupção dos
anos 70.
Não à toa, O. Russell já expõe de início a sua abordagem irônica em meio à atmosfera criminosa que estamos prestes a embarcar: o silêncio inquietante da primeira cena com um personagem literalmente colando o seu cabelo é um belo exemplo. Da mesma forma, o diretor tenta incorporar o cinismo à perspectiva daquele mundo: perceba que o mesmo garoto que é tão querido pelo pai, é sempre deixado de lado, como se a preocupação fosse apenas uma dissimulação; além do grito no banheiro, a dança de Rosalyn ao som de Live and Let Die quando joga o seu marido aos leões, etc. Há algo jazzista e clássico em sua estrutura, mas, ainda assim, espirituoso. Não é algo seco como o cinema scorseseano. É leve. O que ajuda e prejudica, porque – ao mesmo tempo em que tenta criar gags com a máfia, os cassinos, a política e a violência – O. Russell trava nas limitações que autopromoveu. Precisando filmar um drama bobinho travestido de algo profundo e inteligente. O oposto de O Lobo de Wall Street, por exemplo, que gerava graça e desconforto na sua própria profundidade. Não só em estrutura, mas também na forma como seus personagens eram impostos.
Não à toa, O. Russell já expõe de início a sua abordagem irônica em meio à atmosfera criminosa que estamos prestes a embarcar: o silêncio inquietante da primeira cena com um personagem literalmente colando o seu cabelo é um belo exemplo. Da mesma forma, o diretor tenta incorporar o cinismo à perspectiva daquele mundo: perceba que o mesmo garoto que é tão querido pelo pai, é sempre deixado de lado, como se a preocupação fosse apenas uma dissimulação; além do grito no banheiro, a dança de Rosalyn ao som de Live and Let Die quando joga o seu marido aos leões, etc. Há algo jazzista e clássico em sua estrutura, mas, ainda assim, espirituoso. Não é algo seco como o cinema scorseseano. É leve. O que ajuda e prejudica, porque – ao mesmo tempo em que tenta criar gags com a máfia, os cassinos, a política e a violência – O. Russell trava nas limitações que autopromoveu. Precisando filmar um drama bobinho travestido de algo profundo e inteligente. O oposto de O Lobo de Wall Street, por exemplo, que gerava graça e desconforto na sua própria profundidade. Não só em estrutura, mas também na forma como seus personagens eram impostos.
O
policial de Bradley Cooper, numa atuação constrangedora, é a
antítese do agente vivido por Kyle Chandler. Ele é suscetível à
ganância. Gosta de quebrar as regras. Apaixona-se por aquela vida de
crime. A cena em que ameaça o personagem de Louis C. K. (impagável!)
é um dos melhores momentos do longa. Já Amy Adams, que começa
prejudicada por um zoom horroroso para destacar seu choque, é
excelente na composição dividida e duvidosa de Sydney: o travelling
que aponta a mudança de lado dela em uma cena específica é
brilhante. E se Jennifer Lawrence se afunda num overacting terrível,
sobra para Christian Bale e Jeremy Renner roubarem a cena. O
primeiro, principalmente, é o De Niro de O. Russell, ainda que
aquele também apareça. A maneira como conduz as palavras e os
gestos de vendedor só não são melhores do que a forma teimosa com
que ajeita seus óculos – evidenciando um tique tão natural que
até quando está sem eles, mexe ligeiramente seu nariz, como se algo
o incomodasse. O problema é que Trapaça poderia muito mais que
apenas criar piadas com cabelos e narrações múltiplas. Mas
preferiu dar jus ao título.
* Crítica escrita originalmente para o Diário Catarinense
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