31 de outubro de 2015

Os 150 melhores filmes de terror dos últimos 15 anos


Nos últimos quinze anos, o cinema de terror foi marcado por diferentes tentativas de ressuscitar subgêneros, alavancar o potencial de novas franquias e pela infindável quantidade de homenagens aos filmes setentistas/oitentistas, responsáveis pela formação de grande parte dos profissionais atuais. Surgiram grandes nomes e grandes filmes. Por um tempo, o found footage foi um auxílio gigantesco para os independentes, o mumblegore igualmente uniu uma parcela dos realizadores para trabalhos em conjunto, frutos de pouco capital e mais iniciativa. Com o panorama de mais ideias e menos dinheiro para realizá-las, os últimos anos ocasionaram alguns exemplares que automaticamente se tornaram seminais, deixando para trás a terrível década de 90. Definitivamente. 

A seguir, além de indicar cenas importantes das obras (os FYC), listei 150 filmes imprescindíveis para desvendar o gênero nos últimos 15 anos: 

150. Terror no Pântano (Hatchet, EUA, 2006)

Adam Green costuma construir seus terrores com uma dose de cinismo, como faz no simpático Digging Up the Marrow, onde brinca com sua própria filmografia. Embora tente sempre procure providenciar algum drama para a história. Na sua franquia Terror no Pântano, o original é o que mais se aproxima da sua pretensão máxima: construir um slasher autoparódia eficiente para contar a história de Victor Crowley. 

FYC: Após achar que está a salvo, o personagem de Joel Murray tem a cabeça completamente girada e arrancada pelo assassino.  

149. Styria (Hungria, 2014)

Numa continuação lógica do terror vampiresco atual, é um retrato provocante do isolamento e da renegação da família proveniente de uma garota que "grita" por mistério.


FYC: Antes de qualquer marca no pescoço de sua vítima, Lara enfia um caco de vidro no local, como se não quisesse tocá-la.  

148. Sobrevivente (Backcountry, Canadá, 2014)

Em sua estreia à frente de longas-metragens, Adam MacDonald se desprende da proposta de inúmeros filmes do subgênero, envolvendo-nos num thriller crescente e de bom gosto. 

 
FYC: A tensão gerada pelo estranho personagem de Eric Balfour, que produz uma desconfiança preconceituosa do casal Jenn e Alex, quando a preocupação deles deveria ser com a natureza animal, não a humana.  

147. A Estrada (The Road, Filipinas, 2011)

Histórias entrelaçadas não são fáceis em nenhum gênero, o que dificulta as tentativas de Yam Laranas de expor os horrores da estrada que movem seu argumento. Talvez, a obra seja menos efetiva do que a pretensão inicial do diretor supõe, mas é intrigante e é elegante o suficiente. 


FYC: A morte de Lara no banco de trás de um carro pegando fogo. 

146. Quarentena (Isolation, Irlanda, 2005)

Nos últimos anos, a quantidade de filmes de infecção generalizada que se alastrou rapidamente pelo globo foi quase incontável. O filme de Billy O'Brien concentra sua atenção numa pequena comunidade rural, onde a praga é gradativa, natural e tensa.


FYC: Algo começa a subir pelas cobertas de Mary. 

145. Insensíveis (Insensibles. França, 2012)

Juan Carlos Medina pode dar voltas e mais voltas, mas consegue acrescentar a inevitável mensagem: num mundo em que o espectro da guerra sobrevive, a insensibilidade à dor é um estudo que pode render resultados impressionantes. 


FYC: Ao descobrir sua "insensibilidade", uma menina se ateia fogo e outros tentam fazer o mesmo, sem saber que não possuem essa mesma natureza. 

144. Não Documentado (Undocumented. EUA, 2010)

Na constante discussão sobre a imigração nos EUA, em pautas reacionárias, o filme reúne o sadismo do subgênero com o mockumentary, ressaltando uma série de pensamentos "patrióticos" que torna toda a estrutura crível demais e, por consequência, mais intensa.

FYC: Numa espécie de inquisição, um dos imigrantes é questionado sobre aspectos culturais americanos para a decisão de sua sobrevivência ou morte.

143. The Children (Inglaterra, 2008)

Desde a primeira aparição de destaque de uma criança no horror, em O Golem, o uso da figura infantil sempre intrigou, pelo poder de sua dubiedade. Aqui, a fragilidade familiar e o isolamento correlacionam a mudança comportamental dos pequenos com o afastamento de seus pais. 


FYC: A única opção de uma mãe, após ser atacada na barraca pelo seu filho, é matá-lo.

142. Mistério da Passagem da Morte, O (The Dyatlov Pass Incident. Rússia/EUA, 2013)

Típico caso de que nem as atuações inverossímeis ou a direção imprecisa de Renny Harlin sabotam toda a estrutura belissimamente executada pela fotografia, que sempre nos envolve no isolamento daquelas pessoas ou com o futuro delas.


FYC: A intrigante história da expedição que inicia o longa.

141. Hollow (Inglaterra, 2011)

Clássico exemplo de found footage que compreende que o charme do subgênero reside no relacionamento interpessoal dos protagonistas e as consequências de suas ações.


FYC: Um dos amigos deixa os outros para trás e começa a voltar para a cabana sozinho na escuridão. 

140. Livide (França, 2011)

Uma alegoria macabra e insana que dá vida aos seus personagens estranhos, dentro de uma mistura de gênero constantemente instigante.


FYC: O instante que os três amigos entram na casa. 

139. Casa dos Sonhos (Wai dor lei ah yut ho. Hong Kong, 2010)

Seu maior horror é a economia mundial, o que traveste seu drama em um thriller macabro e eficiente.


FYC:  Qualquer cena envolvendo o martelo. 

138. The Final Girls (EUA, 2015)

Não só reinventa particularidades dos slashers para derivar nas excelentes homenagens, principalmente para Sexta-feira 13, como também contrabalança sua espirituosidade com o drama presente no relacionamento entre mãe e filha - resultando na cena mais linda do filme.


FYC: A abertura com Kumba-no e Bette Davis Eyes.

137. Mulberry Street - Infecção em Nova York (Mulberry St. EUA, 2006)

Poucos começaram uma filmografia de forma tão concisa quanto o promissor Jim Mickle. Em seu primeiro filme, o americano foge da natureza cômica de seus correlacionados, culminando em algo mais sádico e trágico.



FYC: Dentro de um bar, acompanhamos o desenvolvimento da infecção e da mutação dos clientes.

136. Plataforma do Medo (Creep. Inglaterra, 2004)

É possível o menos ambicioso e mais falho filme do brilhante Christopher Smith, porém com um primeiro ato espetacular e com o apuro estético sempre interessante do inglês.


FYC: Kate observa seu stalker ser puxado para fora do trem. 

135. Identidade (Identity. EUA, 2003)

A carreira de James Mangold é conhecida por seus altos e baixos, mas Identidade é certamente o ponto mais alto que já atingiu. Ao abordar dez estranhos que se veem emboscados num motel durante uma tempestade e começam a morrer, um a um, o diretor nos insere literalmente dentro da mente de um assassino, o que faz o percurso ser muito mais interessante do que apenas um thriller comum.

FYC: Ed descobre que é apenas uma das personalidades de Malcolm Rivers.   

134. Byzantium (Irlanda, 2012)

Como se vampiros fossem andarilhos que servissem como uma espécie de intermediários entre a vida e a morte, a profundidade que Neil Jordan produz na platônica amizade entre Ella e Clara (nos mesmos moldes de Lestat e Louis) termina conduzindo o terror de uma forma muito mais triste do que aventureira, algo que curiosamente se afasta do que sempre foi seu forte.


FYC: Hanna prova sangue pela primeira vez. 

133. Entes Queridos (The Loved Ones. Austrália, 2009)

Apresentando seus personagens com um fascínio pela loucura e com uma conotação incestuosa, Entes Queridos se compromete emocionalmente com o seu sadismo, o que desperta uma sensação curiosa.


FYC: A dança vulneravelmente emocional (e chocante) de pai e filha. 

132. Boa Noite, Mamãe (Ich seh, Ich seh. Áustria, 2014)

A intensidade com que a narrativa é sobrecarregada, aliada aos tons fúnebres e ambíguos, lança ao espectador uma angústia sintomática e provocante. Severin Fiala e Veronika Franz retornam às perguntas levantadas por Honeymoon e, em menor grau, por A Pele Que Habito: quem está vivendo na mesma casa que você?


FYC: Os gêmeos amarram a mãe em sua cama para descobrir quem é a invasora e o que ela fez com a mãe deles. 

131. Último Trem, O (The Midnight Meat Train. EUA, 2008)

O longa-metragem de Ryûnei Kitamura transita entre a obsessão e o limite do retrato, tornando-se um testemunho primitivo da imitação, pegando como gancho o submundo e a virilidade do personagem de Vinnie Jones.


FYC: O vagão de mortos.

130. Espinhos (Splinter. EUA, 2008)

Antes de tentar a sorte com a franquia O Grito, no terceiro exemplar, o diretor Toby Wilkins estreava neste interessante sci-fi, que se juntava ao apelo de Cabana do Inferno, ao encontrar tons cômicos na abordagem macabra.


FYC: A ajuda chega na pele de uma policial que desconhece o monstro que os cercam no poste de gasolina; por pouco tempo.

29 de outubro de 2015

Ponte dos Espiões

Bridge of Spies, EUA, 2015. Direção: Steven Spielberg. Roteiro: Matt Charman, Ethan Coen, Joel Coen. Elenco: Tom Hanks, Mark Rylance, Alan Alda, Austin Stowell, Jesse Plemons, Dakin Matthews, Amy Ryan, Sebastian Koch. Duração: 141 minutos.

Não há tempo para discutir governos nos últimos filmes de Steven Spielberg; apenas as ações de homens e suas consequências. É a perspectiva humana, o que importa. Deste modo, a primeira cena de Ponte dos Espiões é reveladora ao propor um de seus principais personagens, o Coronel interpretado pelo extraordinário Mark Rylance, num literal autorretrato, onde podemos observar o homem, o seu reflexo e o retrato que pinta de si mesmo. Comum ao longo da narrativa, o triplo ponto de vista acerca de uma mesma situação é sempre fascinante: desde três advogados se reunindo até duas recepcionistas com um vaso de flores ao centro do quadro, o cineasta busca constantemente um intercessor para valorizar seus opostos.

James B. Donovan é o principal intermediário escolhido por Spielberg, sob esta ótica.  Em sua apresentação, o destaque é sua fala: "Não é meu 'cara'. É meu cliente. Há uma diferença". Ali, a sua trajetória está traçada: o advogado é encurralado pelos sócios no escritório com o uso de "dever patriótico"; fica numa posição desconfortável entre dois opostos, enquanto a bandeira americana vibra no fundo; vê-se contra a parede, na prisão, junto com o seu cliente, num plano belíssimo; para, ao fim, tornar-se o interlocutor que sempre se esperou dele, numa negociação em uma ponte pênsil. 

Spielberg se importa com o futuro, em Ponte dos Espiões, mais do que qualquer outra coisa. Assim, mais uma vez, como em Lincoln, o diretor prefere filmar as reações infantis em cenas chaves - se antes, o assassinato de um presidente era trocado pela comoção de uma criança; aqui, um julgamento de um tribunal passa para uma sala de aula, com todas as crianças de pé, jurando amor à bandeira, para depois assistir ao país lançando uma bomba atômica no Japão. 

Numa guerra de informações, Spielberg discorre sobre julgamentos prévios e escancara nossas realidades em diferentes trens. Ao Donavan analisar uma cena de jovens pulando grades para assaltar uma residência, portanto, compreendemos que ainda que estejamos em linhas distintas, o trilho pode ser o mesmo.   


26 de outubro de 2015

Sicário: Terra de Ninguém

Sicario, EUA, 2015. Direção: Denis Villeneuve. Roteiro: Taylor Sheridan. Elenco: Emily Blunt, Benício Del Toro, Josh Brolin, Daniel Kaluuya,  Jon Bernthal, Victor Garber. Duração: 121 min. 

É um cinema de extremos, o de Denis Villeneuve: o controle da mente, em Homem Duplicado; os horrores da guerra, em Incêndios; os atos violentos cultivados pelo desespero, em Suspeitos. Em Sicário, outra vez, o diretor canadense oferece seu niilismo perverso como fruto de compreensão - quais ações levaram os personagens a chegarem até aquele ponto: basicamente o que movimenta sua filmografia.

Assim, Villeneuve procura desculpas para seu sadismo ao demonstrar uma verdadeira zona de guerra nos EUA, fazendo com que a forte líder de operações do FBI, Macy (Emily Blunt), padeça diante dos horrores e da hostilidade que observa no seu cotidiano. É a rua contra a burocracia, em Sicário. Entretanto, numa visão unilateral. 

Se de um lado o talento de Villeneuve é destacado ao quebrar expectativas ou construir uma tensão sintomática, como a vulnerabilidade do policial mexicano (de costas, na cama) demonstra em sua primeira cena, ou nos corpos mutilados expostos, o cinismo com que encara os personagens de Blunt e Daniel Kaluuya afasta. Principalmente, após a brutalidade e a submissão deles, quando o canadense arrisca criar uma humanidade que não existe mais, vide a cena em que os olhos aterrorizados dos dois são os destaques no túnel.

No fim, o registro de um jogo de futebol sendo pontuado por sons de tiros se torna tão incômodo quanto nossa convivência com os personagens de Del Toro e Brolin. Mas não por intenção do diretor. 


*Crítica originalmente produzida para o Diário Catarinense

22 de outubro de 2015

Beasts of no Nation


Idem, EUA, 2015. Direção: Cary Joji Fukunaga. Roteiro: Cary Joji Fukunaga, baseado no livro de Uzodinma Iweala. Elenco: Abraham Attah, Idris Elba, Emmanuel Affadzi, Ama Abebrese, Francis Weddey, Emmanuel Nii Adom Quaye. Duração: 137 minutos.

Numa das cenas mais emblemáticas de Beasts of no Nation, o Comandante inicia um cântico com seu combatentes para durante a dança pré-guerra poder ouvir o coração deles batendo, esperando pelo momento da batalha.  Na guerra física e mental proposta por Cary Joji Fukunaga, as crianças e a juventude são as principais baixas dentro da realidade mortal que elas passaram a fazer parte.

A figura escolhida para dar vida à trajetória de uma criança da ingenuidade para a vingança é Agu, que vivia em uma comunidade dizimada pela guerra civil. É a voz do filme, literalmente - aliás, talvez o único problema, ao criar um conflito entre a brutalidade evidenciada e a filosofia existencialista da narração. A narração de Agu está lá para protegê-lo, não fazer com que o espectador o julgue. Ele procura entender o que está fazendo, quais as ramificações e o que ela está perdendo neste percurso. Soa prejudicial, já que compreendemos os limites que a criança chega ou a abordagem que ela toma.

Desta forma, quando Fukunaga é mais sutil, o filme igualmente ganha uma solidez muito maior. Um dos melhores enfoques do diretor, por exemplo, é a liderança d'O Comandante e seu relacionamento com Agu e Strika. Afinal, o personagem é a figura perdida na vida daquelas crianças, o pai que elas não possuem mais. É o elo de ligação delas entre a guerra e a vingança. Quem os ensina a ser como são.

Nesta perspectiva, a voz do imenso Idris Elba intercala entre simpatia e austeridade, fazendo com que o choque seja muito maior na cena em que se aproveita da fragilidade de Agu, fazendo com que, antes, este acredite que só quer o seu bem e que guarde segredo. Na mesma linha, a voz do Comandante sendo constante no primeiro assassinato de Agu ("Eles mataram seu pai") é reveladora, pois evidencia a extrema influência da figura paterna naquele crime que assistimos.


De tal modo, quando nos deparamos com mísseis tomando os céus, aos olhos daquelas crianças de vigia, compreendemos que no mundo delas, não importa o que aconteça, não há mais estrelas cadentes ou fogos de artifício. Apenas guerra.  

19 de outubro de 2015

Colina Escarlate, A

Não fui, na infância, como os outros
e nunca vi como outros viam.
Minhas paixões eu não podia
tirar de fonte igual à deles;
e era outra a origem da tristeza,
e era outro o canto, que acordava
o coração para a alegria.
Tudo o que amei, amei só.
Assim, na minha infância, na alba
da tormentosa vida, ergueu-se,
no bem, no mal, de cada abismo,
a encadear-me, o meu mistério...
Edgar Allan Poe, Só.

Crimson Peak, EUA, 2015. Direção: Guillermo del Toro. Roteiro: Guillermo del Toro, Matthew Robbins. Elenco: Mia Wasikowska, Jessica Chastain, Tom Hiddleston, Charlie Hunnam, Jim Beaver. Duração: 119 min.

"Duas pequenas borboletas pousam numa lamparina, que aos poucos perde sua intensa luz natural e parece ser sugada por elas". O trecho anterior poderia ser o princípio de uma história trágica de Edgar Allan Poe, mas não o é. É o início de uma bela metáfora cultivada por Guillermo del Toro em sua narrativa, A Colina Escarlate, onde o espectro mais vital de uma família, vinculado à radiante forma de Mia Wasikowska, torna-se atormentado por dois imagos (se nos permitirmos continuar na metáfora), os quais passam a se alimentar de sua juventude, "pureza virgem", dinheiro e solidão.

Na figura de Thomas Sharpe, o novo, o atraente, o mistério que chega na vida de Edith, tal como um poema de Poe, Hiddleston transforma-se na figura gótica sedutora de um estrangeiro que ludibria uma pequena cidadezinha e o tesouro de uma das principais famílias da região. É o Christopher Lee de Guillermo del Toro, cuja dualidade no olhar denota um constante conflito entre franqueza e parcimônia. Suas tentativas desesperadas de consolar uma cada vez mais vítima, Edith, tornam-se uma tentativa de rendição que não já é mais possível. Thomas, afinal, também é uma vítima.

Desta forma, num cruzamento incrível entre Hammer e Hitchcock, del Toro usa o "prometido" ao seu favor. Criando uma obra de pistas/recompensas que é sábia não só em administrar cada individualidade, como também guarda o inesperado em seus personagens. E se os fantasmas surgem como lembranças ou mensageiros, o cineasta brinca com o terror que eles produzem em nós, não importando a natureza da mensagem. Observe a maneira com que os enquadramentos no corredor são feitos pelo mexicano e como ele nunca deixa de entregar o que ele quer - neste sentido, caso um fantasma seja avistado, ele irá aparecer; não importa se isso servirá ou não como susto na trama.

Igualmente, caso del Toro buscasse homenagens impassíveis ao terror clássico, Dr. Alan McMichael nasceria com o único intuito de servir como âncora para a frágil Edith Cushing (Cushing!), que seria salva no último minuto pelo seu cavalheiro sem armadura; correto? Errado. E é aí que a narrativa do mexicano se torna ímpar. Ao começar pela natureza feminista de sua obra, que já é denunciada na maneira dispare como Edith Cushing é vista na sociedade, quase independente, algo que inclusive irá despertar a atenção e amor de Thomas, que acaba se lembrando da própria irmã. Em poucos minutos, Edith é renegada por um livro "masculinizado" para a época, é tratada com desdém pelas mulheres por seu estilo inusitado de não estar à procura de um marido e nunca se deixa influenciar pelo charme do doutor Alan. Ela constrói seu próprio caminho para chegar até a mansão da Colina.

Lucille, interpretada soberbamente por Jessica Chastain, é a única que percebe a força de Edith. A luta final entre as duas não serve apenas como um clímax esperado, mas como um duelo entre antagonistas, paradoxos de uma mesma figura. Cushing x Lee, de outra época. As mulheres são a força de del Toro e é com elas que chegamos às revelações do castelo. Da estrada de sangue que nos conduz até ele - analise, aliás, as marcas no chão que a carruagem passa.

Não à toa, a única nudez permitida no filme é a de Thomas. Uma figura que se rendeu pra sexualidade há muito tempo. E vive por ela. Assim como morrerá.