27 de abril de 2011

A Antropóloga

A moda da exaltação cultural
Assim como Rio: o filme A Antropóloga, do diretor Zeca Pires, apesar de indiretamente, também tem como objetivo celebrar a cultura, neste caso catarinense – desde seus costumes (bruxas, misticismos, cantos) até cartões postais (Ponte Hercílio Luz, natureza e mares). É comum, portanto, que observemos durante toda a narrativa os moradores da ilha cantando músicas nativas, passeios de barco ou escuna pelos mares, pessoas querendo ganhar dinheiro de turistas e entrevistas com pessoas ligadas à cultura do local. O grande problema de Pires é tentar transformar todo o misticismo e a cultura fantasiosa da ilha em um longa-metragem de suspense, algo que não ocorre em nenhum momento e ainda proporciona risos involuntários do espectador.

Escrito por Tânia Lamarca e Sandra Nebelung, o filme conta a história de Malu (a linda Larissa Bracher) que chega à Costa da Lagoa, reduto açoriano na ilha de Santa Catarina, para realizar sua pesquisa de doutorado na área de etnobotânica. Por meio de entrevistas e relatos, ela aprende a cultura mística dos descendentes açorianos. Ao acompanhar o tratamento com ervas aplicado em Carolina (Rafaela Rocha de Barcelos), Malu subitamente começa a ter contato com o sobrenatural e passa a enfrentar as mesmas lendas que a trouxeram até ali.

Juntando vídeos e imagens de arquivos com algumas entrevistas que Malu vai realizando no decorrer da narrativa, a montagem do geralmente competente Giba Assis Brasil se mostra extremamente desconcertante e indecisa a nunca saber qual será o tratamento que o filme vai levar. Além de sermos apresentados a vídeos curtos que mostram Franklin Cascaes ou fotografias antigas de algumas das lendas da região, soma-se uma deselegância incrível do montador, o qual ganha contornos piores ao se juntar a incompetência de Pires que, ao ter assistido filmes de terror demais nos anos 60, explora apenas cortes secos de desenhos místicos, contando ainda com uma igualmente precária trilha sonora.

Aliás, a trilha sonora é um dos verdadeiros desastres do longa-metragem. O trabalho de Silvia Beraldo até começa burocrático e sem muita inspiração ao trazer sons comuns para o gênero, mas do 2º ato em diante vira um completo equívoco – aumentando sua trilha sonora a todo o momento sem finalidade alguma ou apenas para passar uma sensação de insegurança e desconforto (algo que é atingido, mas pelos motivos errados). Além de situações risíveis, como no momento em que para demonstrar um machucado a trilha dá um baque ensurdecedor para frisar que algo naquele local está errado.

Infelizmente, não é só Beraldo que mantém uma qualidade terrível durante a narrativa. Zeca Pires consegue transformar o longa em um completo desconforto. Indeciso, assim como a montagem, Pires realiza enquadramentos completamente nonsenses ao fazer planos plongée e contra-plongée sem finalidade alguma e trazer a câmera subjetiva para ressaltar os matagais e o exterior daquelas moradas com ares de perseguição. Como se não fosse o bastante, os enquadramentos surgem sempre extremamente deslocados tanto nos planos de perseguição quanto nos planos comuns – basta notar a cena em que o diretor mostra um imenso céu estrelado e, logo depois, os protagonistas olhando para o mar e conversando sem o céu sendo visto.

Em contrapartida, a montagem possui lampejos de qualidade ao mostrar como a evolução de Malu vai se desenvolvendo, principalmente, nas ótimas cenas em que Malu entrevista os moradores da ilha sobre como chegaram ali, sua cultura e a quanto tempo moram naquela região. Observe como as entrevistas vão mudando para cenas em que Malu passa a perguntar sobre curas, os mitos dos nativos e, claro, sobre bruxaria e misticismo. As seqüências são eficientes por, justamente, trazer o que ainda não havia sido feito até então: formar o caráter da personagem e fazer com que o espectador acompanhe e compreenda as ações que Malu passará a tomar.

E é criando Malu como uma personagem audaz e com um ar notável de curiosidade que Larissa Bracher é um achado ao surgir sempre fazendo anotações e olhando fixamente para seu entrevistado com um honesto interesse e entusiasmo. A atriz apenas peca em seu exagero em algumas cenas, como em sua visita a benzedeira, onde surge tocando e cheirando as plantas do local ou em outra cena terrível (claro, auxiliada pelo roteiro) em que exclama “Tenho azar com homens, vivo só para o trabalho”. Como se isso já fosse suficiente para formar uma particularidade de sua personagem.


Encerrando com um 3º ato tão vergonhoso que deveria ser proibido por algum tipo de lei cultural, Pires consegue a proeza de compilar todos os erros e clichês que um filme de terror pode oferecer. Portanto, cenas como gatos pretos passando pelos personagens para causar sustos, subidas de trilha que tentam provocar tensão ou falas estúpidas como “Você precisa acreditar para enxergar” e “Ele morreu tem mais de 30 anos” são recorrentes na narrativa e chegam a ser ofensivas. Temos: câncer, bruxas, maldições, lobisomens que voam e tradições culturais. Que maneira para dizer: sejam bem-vindos ao cinema catarinense!

 
(1 estrela em 5)

20 de abril de 2011

A Garota da Capa Vermelha (2011)


Não, essa floresta não aparece no filme!

Em sua crítica de Crepúsculo, o crítico Pablo Villaça foi inteligentíssimo ao expor a analogia que Meyer fazia nos livros ao exaltar o sexo e romancear uma história de ficção. Se Villaça descreve que em Crepúsculo vemos o vampiro Edward que tem um anseio de fincar suas presas na jovem Bella e que não sabe o quanto conseguirá segurar-se; em Crepúsculo 2.0, ops, “A Garota da Capa Vermelha”, vemos aparentemente a mesma situação quando um dos dois personagens apaixonados pela mocinha a pega no colo e diz que quer comê-la. Ora, faz sentido que a diretora Catherine Hardwicke queira manter a sua fórmula de uma mocinha que é disputada pelos dois gostosões da cidade, envolvida por monstros e lendas, mantêm diálogos que seriam encaixados em qualquer filme de comédia com o mesmo timing e exalte o sexo. Porém, Hardwicke passa a considerar o seu público ainda mais incapacitado e nos apresenta com “A Garota da Capa Vermelha” um filme não apenas estúpido, mas algo que mantém uma necedade impressionante durante 1h30min.




Escrito por David Johnson (A Órfã), a história gira em torno de Valerie (Amanda Seyfried) que é uma jovem que vive em um vilarejo aterrorizado por um lobisomem. Ela é apaixonada por Peter (Shiloh Fernandes), mas seus pais querem que se case com Henry (Max Irons), um homem rico. Diante da situação, Valerie e Peter planejam fugir. Só que os planos do casal vão por água abaixo quando a irmã mais velha de Valerie é assassinada pelo lobisomem que ronda a região e o povo do vilarejo parte em busca de vingança atrás do animal.



Demonstrando sua falta de qualidade como diretora desde o começo do longa-metragem, Hardwicke faz um trabalho quase hilário ao dar movimento na sua câmera em cenas que os personagens olham para os lados em tons acusatórios e duvidando de tudo e todos; ou focalizar momentos, como a cena em que Oldman é apresentado e surge um enquadramento de dentro da carruagem focalizando a cruz com o padre no meio; ou dar closes nas reações de seus personagens a cada olhar desafiador. Algo que não serve nem como um exercício técnico para a diretora.



Outro grave problema é que nem a diretora sabe o que quer e isso prejudica não só a narrativa, mas também parece que o filme inteiro foi feito às pressas (algo que parece ser comprovado também na péssima direção de arte). Somos apresentados a cenas em que Hardwicke usa a câmera subjetiva para dar ares de perseguição à personagem, algo que além de nunca acrescentar em nada a trama – principalmente por seu mau uso –, é completamente esquecido pela diretora.



Infelizmente, a direção surge até como hilária, em um conjunto inacreditável de erros e que realmente assustam. Ao começar pela edição de som que faz um trabalho tenebroso ao dar alusão a deslizes de personagens entre sombras e burburinhos quando alguma revelação é feita. A trilha sonora de Alex Heffes e Brian Reitzell também faz um trabalho completamente absurdo ao evocar tons aventureiros em cenas de terror ou romancear cenas que deveriam ser importantes; o único acerto dos dois compositores surge na patética cena da festa em formas de uivos, algo interessantíssimo, mas pontual.



Também apoiando as idéias patéticas da diretora, o elenco parece saber exatamente o que fazer ao encarnar personagens para adolescentes histéricas e o que vemos a seguir é uma repetição das atuações de Stewart e Pattinson no primeiro exemplar da “saga dos vampiros”. Fernandes parece querer demonstrar nervosismo quando engole seco, ou mostra os lábios tremendos, ou vira de lado ao exclamar algo, ou até o jeito de andar de seu personagem. Sua construção patética é ainda acentuada pelo figurino que usa – desde o corte de cabelo até a roupa com um decote em v para acentuar seu físico de galã.



Construindo sua personagem de forma igualmente estúpida, Seyfried é ainda mais terrível ao proporcionar cenas como a péssima cena da festa em que aparece para impressionar Peter insinuando uma espécie de lesbianismo para deixar o outro mais ouriçado, ou a cada respiração ofegante da personagem, com frases como “Eu não acredito em você” ou “O amor é mais forte”.



Aliás, o roteiro sempre colabora para as péssimas atuações do longa, o que acaba também sobrando para o geralmente competente Gary Oldman, que acaba oferecendo uma das piores atuações de sua carreira. Criando seu personagem como um padre lunático e que faria de tudo para matar aquele monstro, a apresentação de seu personagem é ainda mais grotesca ao retratar suas duas filhas saindo da carruagem para ir ao seu encontro e apenas exclamar: “esse é o mesmo monstro que matou nossa mãe”!?




Igualmente patética é a fotografia de Mandy Walker. Um dos grandes exemplos é a floresta que nunca surge com contornos mais escuros ou assustadores, muito pelo contrário, a floresta sempre conta com uma iluminação comum e muito mais segura que a própria vila. Outro exemplo é quando Walker investe num tom azulado para representar a noite em que o lobo ataca a irmã de Valerie, ou a cena em que a câmera mostra um clima ensolarado na direita, a igreja no centro e tons azuis na esquerda. Constrangedor!



Não satisfeita em ridicularizar os contos vampirescos, Hardwicke parece ter prazer em chacotear a mitologia dos lobisomens e brincar com aspectos da história da Chapeuzinho Vermelho. Somos surpreendidos por cenas não só como “que olhos grandes que você tem vovó” – juro que não sei como Seyfried não riu nessa cena -, mas por cenas que podem gerar grandes gargalhadas ao demonstrar o lobisomem falando com a personagem título e a personagem exclamando: “Meu deus!! Você fala...”. Logo, é interessante ressaltar uma das cenas hilárias da patética festa no segundo ato em que vemos uma dança incomum em que Seyfried e sua amiga dançam batendo palmas, numa espécie de “dança de ciranda”. Oras, é a melhor analogia do filme. Remete a mesma maturidade dos envolvidos nessa produção, pessoas com complexo infantil e que acreditam que todos os cidadãos do planeta são iguais: imaturos, irresponsáveis e tolos.




(1 estrela em 5)


Hop - Rebeldes sem Páscoa (2011)


'Hop, Rebelde sem Páscoa' talvez seja um dos novos exemplos de como usar alguns clichês com sabedoria pelos envolvidos de sua produção, ao contrário de 'Zé Colméia', o filme usa de forma divertida os clichês e seu surrealismo. O timing das piadas do longa são boas, aceitável técnicamente e seu personagem principal é cativante. É talvez um dos sinônimos daquela famosa frase usada por muitos de “um filme para toda a família”. Infelizmente, as sequências boas não apagam os erros. Não que o filme surja desastroso, mas a falta de inspiração do roteiro em alguns momentos é inaceitável e bastante deselegante.




Escrito por Ken Daurio e Cinco Paul (do péssimo Meu Malvado Favorito), Júnior (Russell Brand) é um coelho que adora tocar bateria e quer conhecer o mundo, mas seu pai (Hugh Laurie) deseja que ele dê continuidade à tradição de tornar-se o Coelho da Páscoa, seguida a quatro mil anos. Júnior passa a embarcar em uma aventura para fugir de sua responsabilidade, mas um dia, em Hollywood, é atropelado por Fred (James Marsden) e sua vida muda. No meio de gente famosa, seu sonho de ser um astro de rock'n roll vem à tona novamente e agora ele vai ter que se virar para driblar da família e não voltar para suas outras responsabilidades.



Conseguindo utilizar os clichês de forma interessante em algumas cenas do longa-metragem, o diretor é certeiro e cria sacadas ótimas – em que Júnior vai para a mansão playboy com o objetivo de entrar na “casa das coelhinhas”, ou noutra cena hilária em que Júnior reclama de suas acomodações em uma garagem. Além disso, o diretor acerta perfeitamente nas cenas envolvendo David Hasselhoff com frases como “Um coelho que fala? Eu já tive um carro que fala” (numa convencional, mas boa citação ao Super Máquina).



Aliás, o clima de diversão é geralmente proporcionado pelo cativante personagem principal, Júnior, algo perfeito para esse tipo de longa que tem como objetivo agradar as crianças e não deixá-las perderem o interesse – bem estabelecido pelo diretor Tim Hill (também responsável por Alvin e os Esquilos). O grande problema que o diretor passa a enfrentar a partir do final do segundo ato são os inconclusivos arcos narrativos. A aceitação do filho rebelde ao final do longa-metragem é um dos pontos mais risíveis (no péssimo sentido) para a trama. O que traz a impressão de que o diretor tinha um tempo pré-estabelecido e que teve que interromper de maneira brusca suas outras aspirações dentro da trama. Júnior não possui em nenhum momento o pensamento de ser o coelho da Páscoa, o que também torna seu final terrível dentro do que acontece.



Por outro lado, a direção de arte de Charles Daboub Jr. surge convencional, porém competente em mostrar traços da rebeldia de Júnior em um quarto completamente bagunçado e orientado por uma bateria ou na bela fábrica do Coelho da Páscoa – parecidíssima com a fábrica de Willy Wonka e suas cachoeiras de chocolate.



O filme também conta com uma escolha musical excelente em que traz desde jazz até ‘Every rose has its thorn’ da banda Poison, mas com uma trilha sonora que em momentos parece ser tirada de comerciais como “Natal Coca-cola”. O que de certa forma acaba revelando-se uma bela representação do longa – algo que num mesmo fator (música e trilha) pode gerar algo tremendamente irregular. Ainda que tenha seus grandes problemas e seja limitado, “Hop” se torna uma boa opção do gênero em meio a inegáveis filmes piores que também irão estrear nessa semana. Se a opção é uma garota de capa vermelha ou um coelho de chocolate? Sempre irei para o lado do doce, principalmente na Páscoa!



(3 estrelas em 5)