12 de janeiro de 2017

Criada, A

Ah-ga-ssi, Coréia do Sul, 2016. Direção: Park Chan-Wook. Roteiro: Chan-Wook Park e Seo-Kyeong Jeong, baseado na obra de Sarah Waters. Elenco: Min-hee Kim, Tae-ri Kim, Jung-woo Ha, Jin-woong Jo, Hae-suk Kim, So-ri Moon. Duração: 2h24min.

Ao entrar numa casa desconhecida, Sooke (Tae-ri Kim) começa a sentir que está sendo vigiada pelos quadros do local em que mora Hideko (Min-hee Kim), uma herdeira que leva uma vida pacata junto ao seu tio tirano, o qual sobrevive às custas de histórias eróticas lidas para ricaços. Assustada com a atmosfera do casarão, Sooke chega a despertar alguma graça quando entra no quarto de Hideko pela primeira vez e ouve uma história sobre o fantasma da tia desta – apenas para, depois, a herdeira pregar uma peça com um lençol branco. Ali, o que se torna raro no filme, estamos dentro de uma visão de terceira pessoa, do lado de fora, olhando para as duas pela janela, sem consciência particular. É somente uma introdução.

Esse é o segredo do genial Park Chan-Wook ao nos levar às perspectivas de Hideko e Sooke, separadamente, a partir do segundo ato. Ao não conhecermos propriamente suas intenções, a surpresa que seus pontos de virada causam são enormes. O sul coreano, desta forma, pouco tenta falar sobre a invasão japonesa na Coreia do Sul (a única cena talvez mais atrevida, nesta ótica, seja crianças marchando logo atrás de soldados na chuva), pois ele sabe que seus personagens se encarregarão de expor a hipocrisia daquele cenário de forma sutil.

A paixão pelo brutal, pelo masoquismo, dos grandes ricos que se excitam com a descrição de mulheres subjugando homens sublinham esse quadro. Park trata a masculinidade e sua tentativa de ser viril como algo comicamente desprezível – não só dos idosos escondendo seus membros com a mão ao ouvir uma das histórias contadas por Hideko, como também o tio batendo na tia e na sobrinha enquanto seu pênis fica ereto (num plano detalhe eficiente) ou em como o Conde só se preocupa em manter seu órgão antes de seu destino inevitável.

Deste modo, o que antes era chibata, torna-se prazer e algo que não desperta mais memória para Hideko, na cena final, em que as duas dividem um instrumento de dor para atingirem o orgasmo. É, ao mesmo tempo, lindíssima a forma como o cineasta sublinha o encantamento uma pela outra: a cena mais óbvia é a da banheira, onde cada uma de suas perspectivas são mostradas, numa forma brilhante de simular uma tensão – no olhar e no lábio úmido.  

Assim como em Carol, Park se preocupa com a sensação de cada uma e com a leveza da paixão em contraste com o descontrole do tesão. Um paradoxo lindo para se filmar. E que o cineasta faz como poucos.