Inside Llewyn Davis, EUA/Inglaterra/França, 2013.
Direção: Ethan e Joel Coen. Roteiro: Ethan e Joel Coen. Elenco:
Oscar Isaac, Carey Mulligan, Justin Timberlake, Ethan Phillips, John Goodman, Max
Casella, Adam Driver, Stark Sands, Jerry Grayson, Garrett Hedlund. Duração: 104
min.
Não há título melhor
para a nova obra dos irmãos Coen, Inside
Llewyn Davis. Afinal, é a mente e a persona de seu personagem-título que
nos importa, assim como o caminho escolhido por ele durante esse curto trajeto
– tão quanto sua carreira musical. Como chegamos ao início do
longa-metragem? O que nos trouxe até aquele momento de sua vida? Embora não ajam
respostas totalmente certas para aquelas perguntas, o convívio com o personagem
de Oscar Isaac nos dá uma indicação sobre isso. Davis troca royalties por um
cheque independente apenas por necessitar do dinheiro imediatamente, já que abortos
não esperam hits musicais.
Sob esta ótica, os Coen
filmam com total melancolia o sonho utópico dos artistas: ganhar a vida fazendo
o que ama. Desde um escritor até um músico, a questão é a mesma apontada por
Davis num café para Jean: não é desejável a vida num subúrbio com filhos, uma
conta fixa e ser tratado como capacho de estúdio, mas o poder artístico sobre
si mesmo. Não precisar fazer uma música espirituosa sobre um presidente
americano, mas algo intimista, uma ode à vida miserável que vive.
Nosso personagem-título
é o que compõe – as desilusões, amarguras e instabilidade. Não possui um
lugar fixo, dorme em sofás de diferentes pessoas, vive de favores, entre bares
e os amigos são escassos. Suas letras denunciam sempre a sua condição. Nada é
gratuito. Observe, por exemplo, o instante em que Llewyn Davis canta para seu
pai, numa clínica, a música sobre o dia em que sonhavam com os cardumes de peixes
– a cena nunca ganharia a força dramática que exibe sem acompanharmos, antes de
tudo, o drama de sobrevivência de nosso protagonista e os sonhos que ele não
atingiu. O olhar choroso do pai com toda aquela situação e nostalgia é
comovente.
Da mesma forma, os Coen
utilizam o folk para guiar o público não pelo mundo daquele gênero, apesar de
uma participação final ser arrepiante, mas pela música de forma geral e sobre
os sonhos e a realidade de tudo aquilo. A temática não é a busca pelo sucesso
de Davis, mas por uma condição de vida. Ele acredita em sua arte, como mostra a
explosão durante um jantar, e quer ser alguém dentro do ramo. Além disso, a
montagem é tão instigante por nos conduzir a cada um desses episódios
linearmente que toda a ação se torna ainda mais brilhante: Davis está tentando
se reencontrar depois da perda do parceiro, acredita em sua música, um caso que
termina em gravidez lhe tira mais uma vez de sua expectativa musical, o seu
selo não lhe dá a mínima, não há mais nada que lhe segure na cidade, ele vai
para Chicago, é recusado na chance de sua vida, volta para a cidade, decide
trabalhar no porto, ganhar a vida, está desiludido, mas tem que cantar
novamente para cobrir suas dívidas com o sindicato. Tudo está interligado, sem
que esteja explícito. A profundidade aparece na simplicidade da trama.
Todavia, como não
poderia deixar de ser, Inside Llewyn
Davis é o filme de um ator. Se Carey Mulligan se restringe a gritar
obscenidades para o protagonista e Timberlake a ser o bom moço, Oscar Isaac é
sem dúvidas o personagem mais complexo do longa-metragem. Compondo alguém que
parece ter saído de um livro de Kerouac, o ator é intenso em retratar a queda
de sua expectativa profissional até chegar finalmente no momento mais marcante
de sua performance: a resposta que dá quando um empresário diz que o reencontro
com o seu antigo (e falecido) parceiro era uma grande ideia – indicando um
possível pensamento suicida temeroso. John Goodman, por sua vez, faz a sua
melhor atuação em anos interpretando um estranho viciado em heroína. A
sequência passada no carro é possivelmente a melhor do filme.
Sempre surpreendendo
por suas escolhas e pela dosagem certeira de humor, Inside Llewyn Davis termina sendo mais um acerto numa carreira de poucos erros dos irmãos Coen. E por mais que seja tão difícil para nós quanto para o
personagem-título dar um adeus para aquela vida, não poderia existir outro
final.
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