23 de junho de 2014

Entre Nós

Idem, Brasil, 2013. Direção: Paulo Morelli. Roteiro: Paulo Morelli. Elenco: Caio Blat, Maria Ribeiro, Carolina Dieckman, Júlio Andrade, Martha Nowill, Paulo Vilhena e Lee Taylor. Duração: 100 min.

Caso haja algo que a vida nos ensine é que a maioria de nossos sonhos não irá se concretizar. E isso não é necessariamente algo ruim, se pensarmos que muitos dos nossos devaneios juvenis são, bem, juvenis. Desconhecemos o pessimismo dos dias que virão e ignoramos os obstáculos que são reflexos de nossas escolhas. Seus amigos do colegial dificilmente ganharão um nobel, escreverão livros de sucesso ou serão referências em suas áreas. Dentro desse panorama, o diretor Paulo Morelli nos apresenta o retrato de uma juventude que se move por esse princípio: que pensa que, de alguma forma, somos especiais. E somos, obviamente. Cada um à sua maneira; contagiando alguém próximo com sua essência, autocompartilhando-se. Entre Nós é uma narrativa que constrói esse sentimento como raros filmes conseguem: quem seremos amanhã? Estaremos aqui? Seremos alguém nesse imenso mundo em que todos querem ser alguém? O que perderemos neste percurso? Quem perderemos?

Afinal, como a música de Caetano Veloso cantada alegremente pelos personagens no primeiro ato, a lua é clara, mas o sol tem rastro vermelho. Os nossos dias não serão as divagações de nossas noites. O personagem do impressionante Lee Taylor, por exemplo, escreve o final de seu livro durante a madrugada e a única coisa que procura é o breve reconhecimento que desfruta, mas é interrompido em seu caminho. Uma consequência de sua decisão em dirigir sob o efeito de entorpecentes. Algo que não apenas influencia a ele, mas a todos: desde Maria Ribeiro até Caio Blat. Este último, principalmente, passa a viver como o amigo. Busca um visual mais obscuro, esquece a sua expressão jovial, procura o isolamento, torna-se alguém deslocado naquele grupo – como se fosse o único capaz de reconhecer a dor. Porque, na visão dele, é o único que a viveu completamente. (Aliás, é necessário o parêntese para destacar como a melancolia de seu personagem vai crescendo cada vez mais até não conseguir esconder que ele não está vivendo a sua vida, mas a de outro: literalmente.)

Nesta perspectiva, Morelli é brilhante em manter a sombra de Rafa na vida dos amigos. Como se ele fosse um sinônimo para a máxima: “os sonhos terminam cedo demais”. Deste modo, a maneira como o trio, Rafa, Felipe e Silvana, desfruta a felicidade, o descompromisso, a época das experiências sexuais e anestesiantes, além das conversas sobre o futuro, encaixa-se perfeitamente na mudança de suas vidas, posteriormente. Observe a roda de violão durante Na Asa do Vento no primeiro ato e no terceiro: a mise-en-scène com todos pulando e se divertindo, cada um da sua forma, para a mesma roda dez anos depois, onde os acordes são mais lentos, a tristeza é mais imperante e a felicidade parece cada vez mais distante (com muitos nem lembrando da letra). Igualmente, as drogas são trocadas pelo café, o cansaço da manhã; o vislumbre dos anos 90 é só visto no futebol, mas ainda isso denota o afastamento: os homens jogando, as mulheres comentando sobre suas vidas.

A excelente Maria Ribeiro, sob esta ótica, descreve os anos passados com nostalgia típica de alguém que não é feliz. “Há menos discurso hoje em dia!”. Enquanto alguns estão satisfeitos com o comodismo, os outros procuram desculpas para suas frustrações: “Hoje qualquer um é artista, há uma supervalorização do sucesso”. Um resultado, aliás, que Blat consegue eficientemente se mostrar desconfortável – já que até suas referências, como aquela sobre Metamorfose ou Ulísses, soam como um pedido de desculpas. E uma supervalorização sabiamente usada por Vilhena para seus objetivos dramáticos, principalmente no seu desabafo na floresta ou ao exclamar que se sente uma piada.

Ainda assim, a mensagem de Morelli não é dopada de pessimismo, pois mesmo que o afastamento tome conta de nós,  as brigas sejam corriqueiras e viremos jovens com depressão, as expectativas serão voláteis. No fim do dia, afinal, apenas queremos nos reconhecer no espelho e lembrar aqueles tempos de juventude antes do mundo nos ter mudado.

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