Idem,
Brasil, 2013. Direção: Jayme Monjardim. Roteiro: Tabajara Ruas e
Letícia Wierzchowski, baseado no romance de Érico Veríssimo.
Elenco: Thiago Lacerda, Fernanda Montenegro, Marjorie Estiano, Cléo
Pires, Zé Adão Barbosa, José de Abreu, Rafael Cardoso, Fernanda
Carvalho Leite, Apolônio Cypriano, Marat Descartes, Danny Gris,
Leonardo Medeiros, Leonardo Machado, Vanessa Loés, Fernanda Moro,
Miguel Ramos, Janaína Kremer Motta. Duração: 127 min.
Depois de
sua estreia condenável em Olga, era de se esperar que Jayme
Monjardim não adotasse mais a sua conhecida estrutura novelesca e
fosse mais seguro na maneira como apresenta a sensibilidade
dramática. Todavia, já em seu segundo filme, fica claro que o
diretor não possui nenhuma pista sobre o que está fazendo e, caso
fosse um financiador de O Tempo e o Vento, eu pediria para
retirar o nome da minha empresa imediatamente dos créditos.
Escrito
por Tabajaras Ruas (o responsável pelo argumento de A
Antropóloga) e Letícia Wierzchowski, baseado no romance de
Érico Veríssimo, a história começa do ponto de vista de Bibiana
Terra (Montenegro), que, em seus últimos dias, começa a lembrar da
história de amor que viveu com o Capitão Rodrigo (Lacerda). A
partir daí, o roteiro explora o começo da família Terra e o início
do conflito com os Amaral no município de Santa Fé/RS, enquanto ao
fundo também acompanhamos a história gaúcha; dos conflitos entre
Império e farrapos.
Não
estabelecendo um estilo claro desde o princípio, a confusão
narrativa de Monjardim é vista desde o primeiro minuto do
longa-metragem, ao notarmos uma cena em primeiríssimo plano
se transformar, em menos de dois segundos, num establish shot.
Da mesma forma, ele não esquece a natureza novelesca e, provando ser
um péssimo diretor de atores, procura destacar cada expressão
furiosa ou estupefata de seus personagens; além de, noutras
oportunidades, criar uma atmosfera breguíssima em que a luz de uma
vela fica entre um beijo. Além do mais, o diretor parece estar sendo
dirigido (com o perdão do trocadilho) por seu diretor de fotografia:
apenas isso para explicar as inúmeras cenas em que tenta filmar os
orvalhos da manhã sem intenção alguma a não ser de estilo ou em
muitas cavalgadas sem propósitos.
Falando
nisso, Affonso Beato, aparentemente, acredita que fotografar tudo em
contraluz é uma decisão técnica maravilhosa e suficientemente
interessante para destacar os pampas gaúchos. Assim, Beato nem liga
para o contraste deselegante que cria em determinado instante ao
passar do filtro azul para o amarelo sem qualquer justificativa. A
montagem, igualmente, é reprovável em como lida com os flashbacks,
em suas teimosas voltas no tempo – como se quisesse confirmar que
se trata de Bibiana narrando para o Capitão –, além de suas
elipses inorgânicas (uma reação de Cléo Pires ocorrida cinco anos
depois do acontecido é constrangedora). Como se não fosse bastante,
o roteiro de Tabajara Ruas e Letícia Wierzchowski até tenta ir por
um viés mais feminino, refletindo o ponto de vista de Bibiana, mas
como era de se esperar de uma 27ª versão de roteiro, as cenas e os
pensamentos ficam demasiadamente soltos na história e tudo parece
ser feito às pressas. Não que isso evite sobrar tempo para as
piadas infantis, por exemplo, como a inconveniente: “(...) sempre
desconfiei de homem que toca violão. É? Eu conheci muito cafajeste
que não tocava”.
Nesta
perspectiva, fica dificílimo o elenco conseguir se diferenciar,
especialmente quando Thiago Lacerda está focado em ser um personagem
unilateral – o malandro invariável e arrogante – ou Leonardo
Medeiros em ser o típico vilão traído. Cléo Pires, por sua vez,
até consegue irradiar uma dramaticidade adequada, mostrando que está
realmente sentindo a frustração e agonia de sua personagem, mas é
ofuscada pela maneira como o roteiro tenta expô-la. (Volto a me
perguntar se a atriz não teve crise de riso ao gritar que mataram o
seu amado apenas anos mais tarde) E se Fernanda Montenegro surge
desconfortável ao dividir a tela romanticamente com alguém muito
mais novo que ela, o destaque acaba sendo o gaúcho Zé Adão
Barbosa, que oferece uma profundidade muito maior como o “único”
homem de fé da região de Santa Fé – analise que, ao mesmo tempo
em que não se atreve a indicar uma inimizade com os Amaral,
estabelece um sentimento paternal com relação ao Capitão Rodrigo.
A cena dos dois discutindo sobre o que fariam caso fossem criadores
do mundo é a melhor cena do longa.
Ainda que
mostre superficialmente o regionalismo gaúcho (nos duelos, o
churrasco de chão, a honra familiar e as danças) e a reconstrução
de Santa Fé feita em Bagé seja aplausível, O Tempo e o Vento
acaba sendo quase um prelúdio de uma futura minissérie da Globo,
como as próprias cenas acovardadas de batalha ou o estupro nos mostram. Apontando para todas as direções, Monjardim finaliza
sua obra quase de maneira espírita – ressaltando Bibiana e Rodrigo
cavalgando juntos em direção ao pôr do sol: algo que até cria uma
coesão admirável, principalmente ao avaliarmos que a sombra dos
dois forma uma pessoa que lembra muito Pedro índio (o começo de
tudo), mas apenas sublinha que tudo não passou de um acaso, assim
como os outros acertos do filme.
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