7 de outubro de 2013

O Tempo e o Vento

Idem, Brasil, 2013. Direção: Jayme Monjardim. Roteiro: Tabajara Ruas e Letícia Wierzchowski, baseado no romance de Érico Veríssimo. Elenco: Thiago Lacerda, Fernanda Montenegro, Marjorie Estiano, Cléo Pires, Zé Adão Barbosa, José de Abreu, Rafael Cardoso, Fernanda Carvalho Leite, Apolônio Cypriano, Marat Descartes, Danny Gris, Leonardo Medeiros, Leonardo Machado, Vanessa Loés, Fernanda Moro, Miguel Ramos, Janaína Kremer Motta. Duração: 127 min.

Depois de sua estreia condenável em Olga, era de se esperar que Jayme Monjardim não adotasse mais a sua conhecida estrutura novelesca e fosse mais seguro na maneira como apresenta a sensibilidade dramática. Todavia, já em seu segundo filme, fica claro que o diretor não possui nenhuma pista sobre o que está fazendo e, caso fosse um financiador de O Tempo e o Vento, eu pediria para retirar o nome da minha empresa imediatamente dos créditos.

Escrito por Tabajaras Ruas (o responsável pelo argumento de A Antropóloga) e Letícia Wierzchowski, baseado no romance de Érico Veríssimo, a história começa do ponto de vista de Bibiana Terra (Montenegro), que, em seus últimos dias, começa a lembrar da história de amor que viveu com o Capitão Rodrigo (Lacerda). A partir daí, o roteiro explora o começo da família Terra e o início do conflito com os Amaral no município de Santa Fé/RS, enquanto ao fundo também acompanhamos a história gaúcha; dos conflitos entre Império e farrapos.

Não estabelecendo um estilo claro desde o princípio, a confusão narrativa de Monjardim é vista desde o primeiro minuto do longa-metragem, ao notarmos uma cena em primeiríssimo plano se transformar, em menos de dois segundos, num establish shot. Da mesma forma, ele não esquece a natureza novelesca e, provando ser um péssimo diretor de atores, procura destacar cada expressão furiosa ou estupefata de seus personagens; além de, noutras oportunidades, criar uma atmosfera breguíssima em que a luz de uma vela fica entre um beijo. Além do mais, o diretor parece estar sendo dirigido (com o perdão do trocadilho) por seu diretor de fotografia: apenas isso para explicar as inúmeras cenas em que tenta filmar os orvalhos da manhã sem intenção alguma a não ser de estilo ou em muitas cavalgadas sem propósitos.

Falando nisso, Affonso Beato, aparentemente, acredita que fotografar tudo em contraluz é uma decisão técnica maravilhosa e suficientemente interessante para destacar os pampas gaúchos. Assim, Beato nem liga para o contraste deselegante que cria em determinado instante ao passar do filtro azul para o amarelo sem qualquer justificativa. A montagem, igualmente, é reprovável em como lida com os flashbacks, em suas teimosas voltas no tempo – como se quisesse confirmar que se trata de Bibiana narrando para o Capitão –, além de suas elipses inorgânicas (uma reação de Cléo Pires ocorrida cinco anos depois do acontecido é constrangedora). Como se não fosse bastante, o roteiro de Tabajara Ruas e Letícia Wierzchowski até tenta ir por um viés mais feminino, refletindo o ponto de vista de Bibiana, mas como era de se esperar de uma 27ª versão de roteiro, as cenas e os pensamentos ficam demasiadamente soltos na história e tudo parece ser feito às pressas. Não que isso evite sobrar tempo para as piadas infantis, por exemplo, como a inconveniente: “(...) sempre desconfiei de homem que toca violão. É? Eu conheci muito cafajeste que não tocava”.

Nesta perspectiva, fica dificílimo o elenco conseguir se diferenciar, especialmente quando Thiago Lacerda está focado em ser um personagem unilateral – o malandro invariável e arrogante – ou Leonardo Medeiros em ser o típico vilão traído. Cléo Pires, por sua vez, até consegue irradiar uma dramaticidade adequada, mostrando que está realmente sentindo a frustração e agonia de sua personagem, mas é ofuscada pela maneira como o roteiro tenta expô-la. (Volto a me perguntar se a atriz não teve crise de riso ao gritar que mataram o seu amado apenas anos mais tarde) E se Fernanda Montenegro surge desconfortável ao dividir a tela romanticamente com alguém muito mais novo que ela, o destaque acaba sendo o gaúcho Zé Adão Barbosa, que oferece uma profundidade muito maior como o “único” homem de fé da região de Santa Fé – analise que, ao mesmo tempo em que não se atreve a indicar uma inimizade com os Amaral, estabelece um sentimento paternal com relação ao Capitão Rodrigo. A cena dos dois discutindo sobre o que fariam caso fossem criadores do mundo é a melhor cena do longa.

Ainda que mostre superficialmente o regionalismo gaúcho (nos duelos, o churrasco de chão, a honra familiar e as danças) e a reconstrução de Santa Fé feita em Bagé seja aplausível, O Tempo e o Vento acaba sendo quase um prelúdio de uma futura minissérie da Globo, como as próprias cenas acovardadas de batalha ou o estupro nos mostram. Apontando para todas as direções, Monjardim finaliza sua obra quase de maneira espírita – ressaltando Bibiana e Rodrigo cavalgando juntos em direção ao pôr do sol: algo que até cria uma coesão admirável, principalmente ao avaliarmos que a sombra dos dois forma uma pessoa que lembra muito Pedro índio (o começo de tudo), mas apenas sublinha que tudo não passou de um acaso, assim como os outros acertos do filme.  


                                  

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