Depois de sua estreia promissora
no comando de Distrito 9, Neil Blomkamp já provou que sabe criar universos
caóticos, politicamente divisórios e quase primitivos. Com um agravante, achar
que isso é o bastante e não ter o mesmo preciosismo técnico para suas tramas ou
até mesmo para a sua direção – destacando que é um excelente argumentista, mas
um realizador bastante falho.
Escrito pelo próprio Blomkamp, a
história gira em torno de uma divisão de classes que ocorre em 2159. O mundo
está segregado entre ricos e pobres: os ricos vivem em uma espécie de estação
espacial chamada Elysium, onde as pessoas não morrem ou ficam velhas por
possuir um tratamento tecnológico diferenciado; os pobres, por outro lado,
continuam numa devastada Terra, onde há um grupo de rebeldes – comandado por
Spider (Moura) – que tentam fugir do sistema criado pelo governo e para a tão
sonhada Elysium.
Oferecendo imediatamente uma
visão crítica social óbvia, com os ricos em cima e os pobres sendo deixados
para viver abaixo deles, ressaltando uma própria oligarquia econômica, Blomkamp
não é nada sutil em retratar cada uma de suas esferas – assim, desenvolvendo
personagens irritantemente unilaterais. Max, por exemplo, “nasceu para algo
único” e, portanto, está fadado a ser o salvador dos pobres: aquele que acabará
com as linhas separatórias entre as duas classes. Delacourt é uma totalitária
cruel que mata quem quer que esteja tentando chegar ao seu lugar longe da
civilização. Nada é por acaso na narrativa, o que confronta diretamente a
tentativa de soar um prenunciador natural do que está por vir – roubos,
poluição e a tecnologia que nos fará refém. Até mesmo a identificação feita do
governo com seus trabalhadores ganha ares de regime antissemita. Por outro
lado, o roteiro tem decisões acertadíssimas, como aquela em que o Governo,
evitando ao máximo o contato popular, chega ao seu limite, denunciando o seu
tratamento com a classe mais baixa: você só é importante enquanto está vivo.
Assim, a forma como um robô se dirige a Max, agradecendo o seu serviço e que é
para ele tomar sua dose de comprimidos para mantê-lo vivo e trabalhando até a
sua morte, é chocante.
Mas se Blomkamp é interessante no
mundo desordenado que cria, com os próprios humanos se matando, acaba sendo
bastante frustrante em como cria as suas sequências de ação. É comum, por
exemplo, dezenas de cortes por minuto, o que torna tudo indecifrável. Além
disso, pode-se citar o travelling incompreensível feito com rapidez durante uma
luta entre Max e Kruger, que só serve como um exercício bobinho de estilo. E se
o diretor surge perdido na direção, ele também acaba sendo conivente com os
erros que nascem no terceiro ato. Aparentemente sem saber como lidar com o
final de sua trama, Blomkamp chega a colocar o vilão de seu filme com o
objetivo de conquistar o mundo, algo que, imediatamente, deveria ser banido do
cinema. Ao mesmo tempo, passa a criar uma série de coincidências narrativas que
desembarcarão no clímax final e diálogos tão amadores que deixariam Michael Bay
orgulhoso – aliás, há de se aplaudir a seriedade com a qual Damon parece sentir
uma história tão estúpida quanto a do hipopótamo.
E se Damon parece no controle
automático e Alice Braga interpreta a mesma personagem de sempre, Sharlto
Copley acaba roubando a cena ao criar alguém extremamente repugnante e temível
nos dois primeiros atos – algo que é só ofuscado pelo destino que o roteiro
experimenta para ele. Por outro lado, mesmo em um instante reprovável, avalie
como ao se olhar no espelho, com uma aparência muito mais humana do que o
normal, ele próprio não se reconhece. Ao passo que Wagner Moura é competente ao
demonstrar a instabilidade de Spider e ao usar o humor para esconder seus
maiores temores.
Ao fim, acaba sendo uma pena que
Neil Blomkamp ainda não tenha encontrado a mesma excelência por trás das
câmeras. Num ano medíocre para o sci-fi, Elysium vira mais uma obra de
potencial deteriorada pelos esforços de seus realizadores que tentam criar algo
que justifique o uso de seu orçamento.
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