Carrie.
EUA, 2013. Diretor (a): Kimberly Peirce. Roteiro: Lawrence D. Cohen e
Roberto Aguirre-Sacasa, baseado na obra de Stephen King. Elenco:
Chloë Grace Moretz, Julianne Moore, Gabriella Wilde, Portia
Doubleday, Alex Russell, Zoë Belkin, Ansel Elgort, Samantha
Weinstein, Karissa Strain, Judy Greer, Katie Strain, Barry Shabaka
Henley. Duração: 100 min.
Ainda
que exiba sua parcela de problemas, uma das maiores virtudes da
versão de De Palma para a história de Carrie White era a forma como
a sua “antinormalidade” era apresentada e como o
diretor produzia essa opressão até chegar ao clímax descontrolado.
É uma pena, portanto, que a interessante Kimberly Peirce pretenda
apontar uma atmosfera com aspectos surreais demais desde o começo,
deixando de lado a sutileza da obra de 70 ou até mesmo a humanidade
da personagem-título.
Escrito
por Lawrence D. Cohen e Roberto Aguirre-Sacasa, baseados no livro de
Stephen King, a história acompanha a vida da jovem Carrie White,
numa cidadezinha americana, que é criada pela mãe devota, Margaret,
e sofre abuso dos colegas de escola, que acham o seu comportamento
estranho. Depois de ter sua primeira menstruação no banheiro de uma
escola, ela passa a ser ridicularizada por todos no colégio e sua
mãe ameaça tirá-la de lá. Todavia, ao mesmo tempo, seguimos o
arrependimento de Sue e o plano que ela e Tommy fazem para
proporcionar um momento de felicidade para Carrie.
É
criando esse paralelo narrativo, buscando uma empatia com alguns
atingidos no clímax final, que Peirce já começa a demonstrar sua
incerteza com o que realmente passa a sua protagonista com tudo
aquilo. Pois fazendo Carrie explorar os seus poderes aqui e ali,
brincando com livros ou uma bandeira americana, a protagonista já
salienta que quando perder o controle será por pura e simples
vingança – nada é gratuito. Logo, ainda que procure sustentar o
clima de opressão que a personagem vive (as risadinhas na piscina, a
sequência da menstruação, o vídeo, os murmurinhos, o medo da
mãe), a cineasta deixa claro que Carrie controla totalmente a
situação no clímax final, não deixando espaço para dúvidas e
diminuindo a personagem para uma assassina que mata seletivamente.
Tudo
acaba sendo exagerado demais. Peirce já demonstra o nascimento em
condições sub-humanas com os lençóis manchados de sangue num
parto macabro em que a mãe corta o cordão umbilical com a mesma
tesoura que usa nos tecidos que retoca, indica a devoção em demasia
escancarada nos martírios de Margaret e sublinha o medo que
Carrie possui da mãe – o categórico “não” que solta no
gabinete do diretor é vergonhoso. Da mesma forma, a forma como o seu
poder ultrapassa os limites é igualmente absurda ao evocar que a
mente da personagem é capaz de mover concreto, levantar carros ou
derrubar postes de luz. Mas isso não seria tão aborrecível se o
filme não se esforçasse para abraçar temas que carecem de maior
aprofundamento, como os maus-tratos maternos, a religião reprimindo a sexualidade feminina, a afeição de Carrie pelo próprio opressor
e a futilidade da ditadura da aparência. Porque a superficialidade
na forma como Peirce age ao exibir os corpos exuberantes enquanto uma
menina está deslocada ou diálogos como “Deus é bom!” são
desconfortantes.
Compondo
sua personagem com os mesmos trejeitos de sua Abby (Deixe-me Entrar),
concentrando a nossa simpatia em seu aspecto aparentemente frágil e
sensível, Chloë Grace Moretz acerta o tom a partir do segundo ato
quando esboça as incertezas sobre uma possível felicidade (“Pare
de me zoar!”) e amadurecimento, assim fazendo com que o espectador
compartilhe de seu encantamento com a diversão no baile de formatura.
Além disso, o figurino da atriz trata de denunciar a mudança que
ela sofre: observe o crucifixo sendo colocado dentro de suas vestes a
partir do segundo ato. No entanto, a atriz não é tão convincente
em mostrar a raiva incontida em sua cena final ou na forma como lida
com suas ações.
Repetindo
o momento mais importante de seu filme diversas vezes, o que
demonstra a completa insegurança acerca da construção narrativa
até ali, Peirce retorna para a direção no pior trabalho de sua –
até então – curta carreira. Preferindo o literal ao invés da
sensibilidade da narrativa de King, a diretora faz de Carrie um dos
filmes mais frustrantes do ano.
Nenhum comentário:
Postar um comentário