22 de dezembro de 2013

A Grande Beleza

La grande bellezza, Itália/França, 2013. Direção: Paolo Sorrentino. Roteiro: Paolo Sorrentino e Umberto Contarello. Elenco: Toni Servillo, Carlo Verdone, Sabrina Ferilli, Carlo Buccirosso, Iaia, Forte, Pamela Villoresi, Galatea Ranzi, Franco Graziosi, Giorgio Pasotti. Duração: 142 min.

É compreensível que muitos considerem Paolo Sorrentino como um ególotra descabido que procura ostentar seus artifícios como autor em suas narrativas. Mas é igualmente válido, nesta perspectiva, encontrarmos na figura do escritor Jep Gambardella um reflexo preciso para ele. Alguém que vaga pelo mundo, no meio de prestígio e fama, tentando buscar uma novidade que o mova, que o inspire e que o faça querer se autodescobrir novamente. Um sujeito que, apesar de achar o caminho escolhido pragmático, quer encontrar um significado para tudo isso.

Nessa divagação filosofal sobre sua vida e a própria sociedade que o cerca, Jep acaba refletindo na narrativa abrangente de Sorrentino exatamente o que o diretor almejava: desnudar uma sociedade caótica que acredita em subdivisões intelectuais. Dessa forma, o pedantismo presente no longa-metragem é justificável por apresentar a realidade das pessoas que observamos durante os passeios, jantares e reuniões de Jep. Onde a ostentação e a bajulação de egos são rotineiras e demasiadamente necessárias. Um lugar que o romance é inexistente e quase utópico – e basta avaliar a forma como Sorrentino critica essa sociedade ao geralmente colocar sujeitos fisicamente não atraentes (com o costume de focalizar a velhice ou a obesidade) ao lado de suas invejáveis companheiras ou apontar para os casamentos falidos de seus principais personagens. É notável, ainda, que Jep passe a tentar algo a mais em sua vida justamente quando recebe a notícia que um antigo e verdadeiro amor havia morrido. Nada é sem propósito na narrativa de Sorrentino e, nesta análise, podemos enquadrar desde a sequência inicial com as belezas naturais de Roma sendo trocada por uma festa dançante até os diálogos confessionais de seus personagens (“Estamos todos à beira do desprezo”).

Mas o mais curioso de A Grande Beleza é a forma como Jep acaba sendo utilizado para atacar tudo o que, aparentemente, seu diretor despreza – veja, por exemplo, a forma como qualquer tolice passa a ser considerada uma arte aplaudida, e mais uma vez o status é evidente, além da maneira como nosso protagonista lida com a situação. Neste caso, vale destacar uma mulher se chocando contra uma parede apenas para dizer que odeia o seu corpo e taxar, minutos depois, que é uma artista atormentada e à frente de seu tempo: perceba o desprezo com que Jep se dirige a ela. Da mesma forma, é brilhante a situação criada para o personagem de Servillo minimizar o tom de uma socielite que alardeia um sacrifício que desconhece (e a reação de cada um na cena é impecável).

Servindo perfeitamente aos propósitos de Sorrentino, Toni Servillo é genial ao conferir para Jep o tom cansado e sarcástico que seu personagem necessita. Assim, o ator impõe a sua fala com uma acidez e descaso que é impossível não ouvir cada palavra com interesse. Ao mesmo tempo, é soberbo em demonstrar que o fato de não acreditar nas pessoas que o cercam vem de uma autoavaliação, o que rende um olhar marcante em direção a uma freira na fila para colocar botox. Além de evidenciar o seu alto grau de machismo por pertencer a uma realidade em que conhece mais clubes de strips do que qualquer outra coisa.

Encerrando com um terceiro ato intrigante, Sorrentino deixa claro o mundo que a alta classe vive com uma frieza singular, o que lhe diferencia de tantas obras que tentaram o mesmo esse ano. Para o diretor, afinal, tudo termina em morte e, no fundo, o romance é apenas uma grande ilusão. 


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