La
grande bellezza, Itália/França, 2013. Direção: Paolo
Sorrentino. Roteiro: Paolo Sorrentino e Umberto Contarello. Elenco:
Toni Servillo, Carlo Verdone, Sabrina Ferilli, Carlo Buccirosso,
Iaia, Forte, Pamela Villoresi, Galatea Ranzi, Franco Graziosi,
Giorgio Pasotti. Duração: 142 min.
É compreensível que muitos considerem Paolo Sorrentino como um
ególotra descabido que procura ostentar seus artifícios como autor
em suas narrativas. Mas é igualmente válido, nesta perspectiva,
encontrarmos na figura do escritor Jep Gambardella um reflexo preciso
para ele. Alguém que vaga pelo mundo, no meio de prestígio e fama,
tentando buscar uma novidade que o mova, que o inspire e que o faça
querer se autodescobrir novamente. Um sujeito que, apesar de achar o
caminho escolhido pragmático, quer encontrar um significado para
tudo isso.
Nessa divagação filosofal sobre sua vida e a própria sociedade que
o cerca, Jep acaba refletindo na narrativa abrangente de Sorrentino
exatamente o que o diretor almejava: desnudar uma sociedade caótica
que acredita em subdivisões intelectuais. Dessa forma, o pedantismo
presente no longa-metragem é justificável por apresentar a
realidade das pessoas que observamos durante os passeios, jantares e
reuniões de Jep. Onde a ostentação e a bajulação de egos são
rotineiras e demasiadamente necessárias. Um lugar que o romance é
inexistente e quase utópico – e basta avaliar a forma como
Sorrentino critica essa sociedade ao geralmente colocar sujeitos
fisicamente não atraentes (com o costume de focalizar a velhice ou a
obesidade) ao lado de suas invejáveis companheiras ou apontar para
os casamentos falidos de seus principais personagens. É notável,
ainda, que Jep passe a tentar algo a mais em sua vida justamente
quando recebe a notícia que um antigo e verdadeiro amor havia
morrido. Nada é sem propósito na narrativa de Sorrentino e, nesta
análise, podemos enquadrar desde a sequência inicial com as belezas
naturais de Roma sendo trocada por uma festa dançante até os
diálogos confessionais de seus personagens (“Estamos todos à
beira do desprezo”).
Mas o mais curioso de A Grande Beleza é a forma como Jep
acaba sendo utilizado para atacar tudo o que, aparentemente, seu
diretor despreza – veja, por exemplo, a forma como qualquer tolice
passa a ser considerada uma arte aplaudida, e mais uma vez o status é
evidente, além da maneira como nosso protagonista lida com a
situação. Neste caso, vale destacar uma mulher se chocando contra
uma parede apenas para dizer que odeia o seu corpo e taxar, minutos
depois, que é uma artista atormentada e à frente de seu tempo:
perceba o desprezo com que Jep se dirige a ela. Da mesma forma, é
brilhante a situação criada para o personagem de Servillo minimizar
o tom de uma socielite que alardeia um sacrifício que desconhece (e
a reação de cada um na cena é impecável).
Servindo perfeitamente aos propósitos de Sorrentino, Toni Servillo é
genial ao conferir para Jep o tom cansado e sarcástico que seu
personagem necessita. Assim, o ator impõe a sua fala com uma acidez
e descaso que é impossível não ouvir cada palavra com interesse.
Ao mesmo tempo, é soberbo em demonstrar que o fato de não acreditar
nas pessoas que o cercam vem de uma autoavaliação, o que rende um
olhar marcante em direção a uma freira na fila para colocar botox.
Além de evidenciar o seu alto grau de machismo por pertencer a uma
realidade em que conhece mais clubes de strips do que qualquer outra
coisa.
Encerrando com um terceiro ato intrigante, Sorrentino deixa claro o
mundo que a alta classe vive com uma frieza singular, o que lhe
diferencia de tantas obras que tentaram o mesmo esse ano. Para o
diretor, afinal, tudo termina em morte e, no fundo, o romance é
apenas uma grande ilusão.
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