17 de fevereiro de 2012

Abrigo, O




Take Shelter, EUA, 2011. Direção: Jeff Nichols. Roteiro: Jeff Nichols. Elenco: Michael Shannon, Jessica Chastain, Tova Stewart e Shea Whigham. Duração: 120 minutos.

O Abrigo é uma cruza bizarra e interessante entre Campo dos Sonhos e Alucinações do Passado em um episódio de Fringe. Enquanto o personagem de Shannon é alertado por suas próprias neuras sobre preparar um abrigo para uma possível tempestade que se aproxima, acompanhamos gradativamente a paranóia do personagem – algo que se revela não só curioso e instigante de um ponto de vista dramático, como também um meticuloso estudo de personagem.

Escrito por Jeff Nichols, que também é o diretor do longa, a história gira em torno de Curtis Laforche (Michael Shannon), morador de uma pequena cidade de Ohio, que vive com a esposa Samantha (Jessica Chastain) e sua filha de seis anos. Os dois trabalham para juntar dinheiro para suprir as necessidades especiais da filha, mas suas vidas entram em colapso quando Curtis passa a ter pesadelos com uma tempestade apocalíptica e começa a ficar obsessivo em reformar um abrigo no quintal da casa.

Conseguindo intercalar com notável elegância os pesadelos de Curtis com a realidade do personagem, o diretor consegue estabelecer um princípio poderoso e fundamental para fazer seu filme funcionar: a dúvida. Assim, sempre que uma nova cena aparece o espectador teme o que se sucederá e se será um sonho ou realidade – desde os primeiros momentos, como quando o cachorro de Curtis morde seu braço e esse passa a colocá-lo na rua, até momentos mais significativos, como quando Curtis tem uma briga com seu colega de obras. A dúvida é tão freqüente que assombra tanto o personagem de Shannon quanto o espectador, e note, por exemplo, quando o personagem explode numa confraternização depois de ter sido o responsável pela transferência de seu amigo e como ficamos esperando Curtis acordar de um sonho que nunca houve.

Da mesma forma, o diretor consegue demonstrar todas as nuances do casal interpretado por Chastain e Shannon, trazendo uma serenidade no primeiro ato que começa a degringolar aos poucos quando vemos os sucessivos colapsos de Curtis – e podemos observar que, mesmo que Samantha mantém-se firme do lado de seu marido e dê valor aos votos que fez, surge com olhares de verdadeira preocupação quando contracena com Curtis. Além disso, não há como não se importar com um personagem que no menor indício de dúvida de suas faculdades mentais e que poderia ferir com isso sua própria família: procurou ajuda.

E é justamente em seus atores que Nichols encontra toda a sustentabilidade e segurança que a história precisa. Shannon é preciso ao compor seu personagem com a preocupação necessária e quase doentia de proteger sua família – e aqui, surge de forma certeira à frase de Dewart para Curtis: “Você tem uma ótima vida! É a melhor coisa, podermos olhar para a estabilidade que vivemos e pensar: isso é bom.”.  Estabilidade que Curtis precisa manter a qualquer preço, soando verdadeiramente chocante e honesta sua frase para as dezenas de pessoas na cena mais marcante do filme: a do jantar.

Já Chastain, consegue ser perfeitamente o ponto de equilíbrio da família e mantém-se segura ao lado do marido perante a sociedade, mas não deixa de mostrar certo nervosismo quando está ao lado do marido. E podemos tanto destacar a cena do jantar com a comunidade, mais uma vez, em que Samantha serve como apoio para seu marido – no sentido literal e figurado –, quanto na cena em que ela simplesmente abraça Curtis para agradecê-lo pelo seu trabalho e o plano de saúde que o acompanha.

Contando com um terceiro ato que dosa bem o nível de suspense que a trama adquiriu até então, Nichols não apenas acerta em dar o primeiro susto na comunidade, como também é corajoso e faz, de novo, duvidarmos do protagonista e suas ações. Assim, é notável vermos que pouco importa o quão às pessoas pensem que Curtis é lunático ou psicótico nas cenas em que a sociedade o julga, o único interesse do personagem era apenas passar a mensagem. Uma mensagem que recebeu e que era seu dever cumprir e proteger sua família. Sendo assim, Nichols é brilhante ao resgatar justamente essa essência familiar em seu clímax final e Shannon olhando quase agradecido para sua família e a tempestade que se aproxima, demonstra justamente isso, como se dissesse: “Viram, eu estava certo!”.

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