14 de julho de 2014

Lunchbox

Dabba, Índia, 2013. Direção: Ritesh Batra. Roteiro: Ritesh Batra. Elenco: Irrfan Khan, Nimrat Kaur, Nawazuddin Siddiqui, Nakul Vaid, Yashiv Puneet Nagar, Denzil Smith. Duração: 104 min.

O mais envolvente de filmes como o indiano Lunchbox é a genuína simplicidade. Sem a expectativa de criar algo extraordinário demais ou que incomode por sua dramatização excessiva, o diretor Ritesh Batra compreende que a autorreclusão e o nosso condicionamento a abraçar a infelicidade em casos que não conseguimos lidar é por si só uma história bastante ambiciosa. E é exatamente isso que é o mais empolgante na vida de Saajan e Ila: afinal, elas são duas pessoas prisioneiras de suas realidades que, finalmente, acham uma saída ao se encontrarem.

Escrito pelo próprio Batra, a trama acompanha uma dona de casa, Ila (Kaur), que está num relacionamento cada vez mais insustentável com seu marido. Vivendo num apartamento apertado e sem privacidade alguma, já que a vizinha de cima (sua tia) está sempre manifestando suas opiniões sobre tudo, ela utiliza um serviço de entrega de comida popular chamado Mumbai Dabbawallahs para entregar o almoço para o marido. Um dia, contudo, um erro faz a entrega chegar ao viúvo Saajan (Khan), que descobre uma oportunidade rara de sair de sua rotina. Logo, os dois começam a trocar mensagens por meio das embalagens usadas pelo serviço de entrega, criando uma espécie de apoio mútuo em momentos delicados de suas respectivas vidas.

Estabelecendo o dia a dia de seus protagonistas desde o princípio, acompanhando a situação em que vivem, Batra é eficiente em retratar a mudança completa que uma simples falha ocasiona numa rotina tão convencional. Assim, ainda mais que a surpresa de Ila em descobrir que seu marido não havia recebido aquele instante de carinho produzido por ela, representado por sua comida favorita, a empolgação de Saajan de provar uma culinária diferente passa, igualmente, ao lhe diferir dos demais – como aponta o personagem Shaikh logo depois. Da mesma forma, é intrigante analisar como o próprio processo de correspondência passa a ser uma interferência tão grande na vida de ambos, que faz com que Ila pense realmente estar sendo infiel ao seu esposo (“O caminho para o coração é o do estômago”). . Neste caso, além da citada cena em que ela propõe uma forma de se aproximarem novamente através da comida, note o medo da personagem ao ouvir do esposo que a comida estava fazendo mal para seu estômago, como se ele tivesse descoberto que as atenções dela não fossem as mesmas ou que ela o ferira. E isso, ainda que não explicitado, vindo de um homem que dá ares de que claramente está traindo Ila ao decorrer do longa-metragem, desde sua falta de atenção ao seu isolamento misterioso.

Já Saajan é um sujeito pragmático, organizado e somente um número numa fábrica que lida com números. Perto de sua aposentadoria, a aparição de Ila em sua vida o faz conseguir criar vínculos emocionais novamente, algo que havia perdido desde a morte precoce de sua esposa. O seu relacionamento com Shaikh é tão diferente para ele, por exemplo, pois ele o faz lembrar Ila – a primeira conversa é justamente sobre o almoço. (E é importante ressaltar o belo ícone registrado no tapete na frente do apartamento de Ila quando a entrega volta pela primeira vez.) Igualmente sensível, por sua vez, é a maneira que o personagem de Saajan passa a se dar conta da idade: começando por uma simples conferida no jantar de uma família, passando pela cena em que ganha um lugar no ônibus, para chegar ao encontro no restaurante. Do mesmo modo, a química entre os protagonistas é gritante na troca de cartas, rendendo grandes devaneios – o meu favorito, talvez, seja aquele do filho sendo usado para manter um casamento.

Finalizando com uma ótima coesão, ao conferir certo peso a uma declaração de Shaikh (“o trem errado pode levar à estação certa”), Lunchbox é uma grata surpresa de um cinema que sempre teve como objetivo celebrar uma felicidade através da dança e de seus exageros visuais, mas que aqui encontrou na simplicidade sua verdadeira aptidão.


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