Idem, Brasil,
2014. Direção: João Jardim. Roteiro: Tereza Frota e George Moura. Elenco:
Tony Ramos, Drica Moraes, Thiago Justino, Alexandre Borges, Clarisse Abujamara,
Caco Baresi, Michel Bercovitch, Luciano Chirolli. Duração: 100 min.
Existe certa similaridade
no argumento de Getúlio com o de outras obras que humanizam ditadores. Num
determinado instante, por exemplo, João Jardim trata de destacar o presidente
possuindo dificuldades em algo tão simples como amarrar os sapatos, enquanto
inúmeros problemas de cunho político o cercam. Mas se num ponto de vista
histórico-idealista, Getúlio Vargas não era um sujeito que poderia ser
considerado um “ditador comum”, tampouco o diretor oferece algo que apresente
profundidade à figura complexa daquele gaúcho que mudou para sempre a história
do país, limitando-se a contar com a atuação de Tony Ramos.
Não que isso aponte o
que há de pior no longa-metragem, pois, muito pelo contrário, o ator
protagoniza através de algumas particularidades o que Getúlio realmente poderia ser: um grande estudo de personagem.
Tentando afastar dos pensamentos que um de seus filhos poderia estar envolvido
num grande esquema de corrupção ou uma das pessoas com quem convivia
diariamente poderia estar envolvida num assassinato, Ramos ostenta em seus
gestos – muito mais que nas palavras – o que passa em sua mente. Assim, as ações que o levam até o
esperado clímax ficam muito mais impactantes, ainda que o diretor falhe em
assegurar essa tensão. Um dos melhores momentos do filme, aliás, é justamente
quando um constantemente atacado Vargas sorri timidamente quando aplaudido em
um evento, após passar cabisbaixo por um corredor de pessoas o julgando.
Mas se Tony Ramos
procura criar um sujeito que não seja unilateral, o restante do elenco cai no
exagero ligado ao filme: Dantas como líder da oposição ou Borges como Carlos
Lacerda são sempre verdadeiros canalhas, o que também retrata a parcialidade do
roteiro desenvolvido por Frota e Moura. Além disso, os dois roteiristas sempre tentam sugerir um paralelo atual para a história, orientando o público sobre um
gabinete tomado de corrupção sem conhecimento do Presidente da República; mas sem passar do tom superficial.
Todavia, o amadorismo
de João Jardim se sobressai mais que outros problemas. Ao tentar manter um
clima breguíssimo de mistério, como os enquadramentos de portas entreabertas
sugerem, o diretor ainda investe inexplicavelmente em tomadas breves e
inorgânicas – observe, assim sendo, o momento em que o prato de arroz e feijão
do presidente é mostrado apenas para sublinhar a sua “humildade” ou uma
personagem jogando um copo contra a parede sem qualquer indício prévio. Aliás, suponho
que o processo de decupagem do filme deve ter sido caótico, tendo em vista a tara
de Jardim por longos planos concentrados nos lustres do catete. Além do mais,
subestimando por completo a inteligência do espectador, o
cineasta acha uma ideia brilhante colocar legendas especificando cada ministro
numa reunião com o presidente.
Explorando o perfil
de Vargas, sempre acompanhado de seu charuto, o maior erro de João Jardim é
acreditar que o ritmo do filme é ditado por quantos planos ele tem; não por sua
substância. Desta forma, Getúlio acaba sendo uma narrativa demasiadamente
inchada e muito distante de seu retratado.
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