2 de abril de 2014

Ninfomaníaca – Volume 2

Nymphomaniac: Vol. II, Dinamarca/Alemanha/França/Inglaterra, 2013. Direção: Lars Von Trier. Roteiro: Lars Von Trier. Elenco: Charlotte Gainsbourg, Stellan Skarsgard, Stacy Martin, Shia LaBeouf, Jamie Bell, Mia Goth, Michael Pas, Willem Dafoe. Duração: 123 min.

“Como combater a sexualidade?”, Joe começa a pensar quando se encontra num momento de sua vida que o prazer já não existe mais, apenas o sofrimento. Como contar a sua história? Quais as diretrizes que a levaram até àquele instante? É interessante e chocante, assim sendo, como Von Trier não se restringe a abordar a sexualidade infantil em diversos momentos e a beleza quase que divina do orgasmo. Diferente do primeiro volume, o sexo passa a ser mais profundo, não somente algo exato – ainda que a combinação dos números seja vista, outra vez, numa cena derradeira. O alvo do dinamarquês passa a ser a solidão e a liberdade sexual. Mas como contrapor a dinâmica extremamente sexual de alguém que chega ao prazer da forma mais liberal possível? A solução chega no assombroso desenvolvimento moral de Seligman, que, personificado por um irrepreensível Stellan Skarsgard, surge exatamente como a primeira pessoa que pode ouvir o que Joe tem a dizer por não possuir desejos ou olhares julgadores. Seligman não é celibato, mas não existe sexualmente. Considera-se assexuado. É exatamente o oposto da protagonista.

Da mesma forma, o equilíbrio do primeiro filme é trocado por uma atmosfera muito mais intensa e madura, como não poderia deixar de ser, a medida que Joe se desprende de interesses sociais (marido, filho, emprego, ser alguém “normal”) e procura apenas ser feliz satisfazendo os seus desejos. Os primeiros minutos que a personagem perde a sensação sexual, por exemplo, é um dos episódios mais assustadores e dramáticos de sua vida – o que causa uma ironia posterior belíssima. Todavia, se Von Trier acerta no timing dessa segunda parte, o mesmo não se pode dizer de suas metáforas, que – novamente – travam na forma explicativa com que se evidenciam. A pior delas, certamente, envolve a menina de cinco anos num orgasmo espontâneo. É vergonhosa a iniciativa de Seligman indicar o que seria a garota flutuando. Por outro lado, é brilhante a forma que o diretor exprime o relacionamento de Joe e P, bem como a descoberta da almejada árvore – a última lembrança do pai. Sem falar, claro, nos problemas físicos que a vida desregrada cultiva, envolvendo-a na criminalidade, além de oferecer sequências fantásticas de BDSM: desde os hematomas até chegar ao prazer proporcionado num equilíbrio entre dor e estimulação.


Como se não fosse o bastante, Von Trier ainda encaixa certeiramente uma faceta feminista em sua obra: estaríamos realmente chocados com as ações de Joe, caso ela fosse um homem? Afinal, o abandono de filhos, inúmeros parceiros sexuais e o vício é algo constante no cinema norte-americano; mas quando a mulher é a protagonista? É uma pena, entretanto, a forma infeliz e hipócrita (o que ela mais naturalmente abominava) que o dinamarquês propõe o desfecho. Entendível a maneira que Joe encontra de fugir de sua sexualidade, como prometido, mas a que ponto? Ao ponto de mudar drasticamente uma personalidade moralmente complexa tão somente para impactar um público que já estava ferido o suficiente. Algo que nunca suspeitaríamos de Von Trier. 


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