Há um livro de John Connelly que sentencia que toda (boa) história deveria começar com “Era uma vez...”. Sem aclamar ou contestar o pensamento, certamente é algo que exala algum tipo de charme e magia: numa história de terror, então, apresenta-se agradavelmente interessante por nos remeter a grandes histórias contadas ao redor de uma fogueira durante a infância. É notável que Muschietti comece dando essa perspectiva corajosa a um longa-metragem de horror, porém é uma pena que sua audácia seja apenas pontual e precipitada, não encontrando o tom consistente que procura.
Escrito por Andrés e Barbara Muschietti e Neil Cross, o filme nos apresenta a vida de uma família que é afetada por uma grande tragédia envolvendo o assassinato de uma mulher e o sequestro de duas crianças. O tio das duas crianças, que é irmão do criminoso, contrata os serviços de algumas pessoas para descobrir o paradeiro das garotas (acreditem ou não, durante cinco anos ninguém notou um carro que saiu para fora da estrada!), o que anos mais tarde ocorre. O problema é que as duas crianças viveram de forma selvagem durante esse tempo e agora terão que se readaptar à sociedade. Como se não fosse o bastante, as crianças parecem trazer alguém a mais neste retorno, a qual elas chamam de Mama.
Entregando o tal fantasma no início da obra, Muschietti investe muito mais no mistério acerca do que realmente quer Mama e sua natureza do que suspense na aparência do monstro. Aliás, o roteiro parece sempre antecipar algumas informações e acontecimentos – note, por exemplo, o ocorrido com o tio das crianças. Esse fator acaba sendo uma das enormes vantagens do diretor na trama: ao invés de ser previsível em seus atos, explora outros pontos de vista, como a evolução de cada personagem ou nas mudanças temperamentais ao serem colocados em frente de destinos improváveis. Da mesma forma, o diretor é sábio ao fornecer detalhes de sua trama por meio de uma transmissão de rádio ou nos planos que efetua para dar uma atmosfera intensa – observe o excepcional enquadramento que exibe Lilly brincando com alguém enquanto Victória e Annabel aparecem em outro cômodo.
Em contrapartida, Muschietti se manifesta como alguém completamente inseguro quando a trama vai se sucedendo e, ao mesmo tempo em que procura estabelecer um fator surpresa, insiste no enfoque convencional do gênero – algo que acaba despertando uma profunda irritação pelo potencial perdido. Logo, olhares assustados, pesadelos em que a personagem sente o que está acontecendo na casa e aparições desnecessárias vão ofuscando as qualidades de até então. Igualmente, a decisão de o diretor revelar Mama a quase toda a hora faz perder o impacto que a personagem possui, além da explicação inoportuna sobre sua origem. Sem deixar de citar as homenagens óbvias que são feitas sem muita inspiração.
Ainda, mesmo que o roteiro tenha grandes momentos – uma sacada interessantíssima é o fato de que os óculos representam a separação de terror e realidade para Victória; analise, portanto, que quando ela se dirige para Mama ela tira os óculos –, são inadmissíveis tantos furos no roteiro. Além do carro na estrada que ninguém viu durante cinco anos, saliento o momento em que o personagem de Waldau afirma que sairá do hospital em um dia, mas parece sair um mês mais tarde (e sem alta alguma), afora o portal e a desculpa para os protagonistas habitarem uma casa vitoriana.
Jessica Chastain, por outro lado, encontra uma linearidade excelente para destacar sua Annabel. Enquanto ela começa comemorando um teste de gravidez negativo e com uma linguagem pesada, transforma-se gradualmente em alguém muito mais preocupada e protetora (avalie que ela começa com uma banda, passa a ter só o baixo e não quer ficar sozinha com as garotas, para depois ela se tornar muito afetiva com elas).
Por fim, mesmo que aqui ou ali tente trazer um charme apavorante, como Annabel olhando no closet ou embaixo da cama das garotas, nada justifica o “Era uma Vez...” presente no início do longa-metragem – afinal, o filme não é original e sua magia é precária e inconstante – a não ser que seja puro exercício de estilo. Mama, na verdade, talvez funcionasse de forma muito melhor se fosse contada ao redor de uma lareira (como aquela que ilumina as meninas) do que no cinema. Pelo menos foi a mensagem que Muschietti passou.
Um comentário:
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