3 de junho de 2013

Além da Escuridão - Star Trek

Star Trek Into Darkness, EUA, 2013. Direção: J. J. Abrams. Roteiro: Roberto Orci, Alex Kurtzman e Damon Lindelof, baseado no seriado televisivo de Gene Roddenberry. Elenco: Chris Pine, Zachary Quinto, Benedict Cumberbatch, Karl Urban, Zoe Saldana, Simon Pegg, John Cho, Anton Yelshin, Bruce Greenwood, Peter Weller, Alice Eve, Leonard Nimoy. Duração: 132 min.

Sempre que os filmes da franquia Star Trek se basearam no relacionamento entre seu trio principal, o universo idealizado por Gene Roddenberry ganhava muito. Mesmo que o primeiro longa-metragem com J. J. Abrams no comando não tenha tanto dessa esperada química, dá-se um desconto por tratar de um retorno daquele mundo ao cinema e de uma apresentação para uma nova geração; entretanto, nesse novo exemplar, não há mais desculpas quando notamos o diretor trocar emoções genuínas por uma aventura confortável.

Escrito pelos responsáveis por filmes como Cowboys & Aliens, Bem Vindo à Vida e Transformers, a trama é basicamente uma refilmagem de outro filme da série original, A Ira de Khan. Em uma nova missão, a tripulação da nave Enterprise se dirige para um planeta habitado por klingons, cuja raça está prestes a iniciar uma guerra contra a Federação, a fim de localizar um ex-agente da Frota Estelar que passou a atacar seus ex-comandantes.

Inserindo-nos na aventura de imediato, numa eficiente sequência que se passa em um planeta primitivo, com o objetivo de parar a erupção de um vulcão, Abrams já focaliza a interação clássica entre o trio de protagonistas – enquanto Bones serve como o equilibrio irônico da impulsividade de Kirk frente a racionalidade de Spock, observamos na dinâmica um completando o outro: isso é perfeitamente visualizado em um exame médico nada comum de McCoy em Kirk. Além disso, o diretor é hábil em apresentar as distinções e leva o crédito da ótima montagem de Maryann Brandon e Mary Jo Markey, que administram bem o ritmo: o fato de Kirk ser mulherengo não caber nos diálogos não afeta essa particularidade quando o vemos acordando em um hotel, por exemplo. Mas, muito mais do que isso, os montadores são exemplares no uso de raccords: poderia citar a transição sonora de um “holy shit”, mas o mais admirável é uma fusão feita entre um desenho no chão e a Enterprise.

Por outro lado, ainda que procure ressaltar a relação entre os três protagonistas para dar o impacto necessário para o terceiro ato, o filme falha miseravelmente por sua abordagem mais aventuresca do que intimista – algo que o filme de 1982 possuía. Assim, não sentimos o mesmo peso de uma decisão que havíamos experimentado há mais de 30 anos e muito menos a mesma coragem em questão, pois, ao contrário do que Abrams queira passar no tom humano (basta ver a forma como Spock se rende à sua emoção), sua decisão parece a de querer nunca sair de uma zona segura. Falando em segurança, algo que ele já gosta de justificar como estilo, Abrams não se envergonha em envolver cada tomada sua com algum tipo de flare – chegando ao cúmulo de fazer com que quase não enxerguemos claramente os contornos da personagem de Alice Eve em um momento.

Entretanto, boa parte dos problemas de Além da Escuridão são eclipsados pela presença notável de Benedict Cumberbatch no papel de antagonista. Claramente o personagem mais profundo da história e com caráter volátil aos seus próprios interesses, como não poderia deixar de ser, o ator surge sempre imponente, aproveitando-se dos closes de Abrams que o destacam – basta analisar sua conversa com Kirk abordo da Enterprise. Além disso, a imprevisibilidade de suas ações passa a fazer com que o espectador questione a sua real natureza e até se compadeça com sua busca, mesmo que sua crueldade seja nítida. Zachary Quinto, por sua vez, procura utilizar o lado mais humano de Spock novamente, porém, não chega ao resultado que espera no grande clímax; ao passo que Pine limita-se a ter os mesmos conflitos do primeiro filme e Urban em investir no alívio cômico.

Ainda que seja evidente seu potencial, esse recomeço de Star Trek aponta que se necessita de um cuidado maior em sua produção. Abrams mostra que não basta somente homenagear os personagens clássicos com breves aparições, mas que há de se moldar questões tão emblemáticas como aquelas que Roddenberry ousou mostrar um dia.

                             

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