10 de dezembro de 2012

Holy Motors


Idem, França/Alemanha, 2012. Direção: Leos Carax. Roteiro: Leos Carax. Elenco: Denis Lavant, Kylie Minogue, Eva Mendes, Edith Scob, Elise Lhomeau, Jeanne Disson, Michel Piccoli e Leos Carax. Duração: 115 min.

Em uma das melhores cenas de Holy Motors, o personagem Oscar vira para sua “filha” e exclama: “O que vou fazer? Darei uma volta por aí. Seu castigo, minha pobre Angèle, é você ser quem você é. Ter que conviver consigo mesma”. E nada poderia ser mais fidedigno do que essa sentença para explicar o porquê de Oscar ser daquela forma e trabalhar daquela forma: afinal, quando apenas ensaia uma fuga de sua rotina, sem script, o sofrimento acaba sendo o seu único destino. Assim, Carax permite-se não apenas brincar com os diferentes tons de personagens de seu protagonista, como também oferece uma irresistível humanidade para ele durante todo esse percurso.

Expondo desde o princípio a figura conflitante que há em seus personagens (a direção de arte já é perfeita ao demonstrar um quarto embaixo de um cinema, onde observamos duas camas separadas, florestas como papel de parede e uma janela destoando daquela realidade), a trama acompanha a rotina de um homem que vive inúmeros personagens durante seu dia. A pergunta que se sucede na narrativa acaba sendo: até onde aquilo é real e o que move Oscar a personificar diferentes pessoas, seu trabalho?

E mesmo que demore em responder essa pergunta, Carax vai dando dicas a todo o momento do que realmente está acontecendo (como a conversa na limusine ou a leitura de roteiro). Se em determinado momento somos compelidos a pensar que aquilo tudo pode não passar de um sonho de Oscar; noutro momento, considera-se que a história do ator que muda de cenário e roteiro para fugir de sua própria vida é a única realidade provável.

Seja como for, o que importa para Carax é a confusão psicológica de seu Oscar (Denis Lavant, perfeito!) e o que cada etapa leva ao pensamento daquele homem. No primeiro momento, por exemplo, notamos a visão mais adolescente de riqueza, um empresário; após esse momento, quando o dinheiro começa a pesar, o personagem encarna um mendigo; depois, apenas os movimentos importam numa emblemática cena divida com Kylie Minogue; em seguida, como sanfoneiro, consegue se enturmar, pela música, com outras pessoas que o seguem. Ainda que tudo seja parte de um grande roteiro em que Oscar segue a risca pelo “prazer do ato”, o diretor aproveita para dar profundidade ao seu personagem por essas situações vividas por ele.

Como se não fosse o bastante, Carax ainda passa a brincar com os episódios dando um dinamismo para cada um deles: a saída do monstro de um bueiro, com a trilha pontuando os momentos mais tensos, e o destaque do lugar por uma espécie de iris shot é um perfeito exemplo. Da mesma forma, a modelo vivida por Eva Mendes, que é sua presa, aparece sem vontade própria, apenas como uma presença imóvel e sem forças, retratando o seu uso como objeto. Ou, até mesmo, Oscar e a simbólica morte de si mesmo durante um dos seus atos.

No fim, o grande acerto de Leos Carax é não proporcionar para seu público respostas fáceis, e deixar perguntas persistindo mesmo após o término do filme. Afinal, o mundo em que estávamos inseridos fazia parte de uma grande encenação? O que fica de certeza é que o diretor conseguiu uma bela maneira de desacordar o público e dar a ação refletida numa bizarra conversa ocorrida durante seu clímax. Em outras palavras, Holy Motors consiste num fantástico estudo de personagem e levanta dúvidas em nossas mentes de até onde tudo aquilo era somente um papel.

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