Like Someone in Love, França/Japão, 2012. Direção: Abbas Kiarostami. Roteiro: Abbas Kiarostami. Elenco: Rin Takanashi, Tadashi Okuno, Ryo Kase e Denden. Duração: 109 min.
Um Alguém Apaixonado se passa, basicamente, em apenas quatro lugares: em um café, num trajeto de taxi, no apartamento de um personagem e durante uma volta de carro. E é nessa lentidão precisa que está a força narrativa do novo filme de Abbas Kiarostami, explorando cada particularidade de seus personagens nas situações que ocorrem durante essas sequências. Assim, contando com poucos personagens para estabelecer, o diretor consegue dar profundidade até para um taxista ou para uma senhora que vê a vida passar pela vista limitada de uma janela.
Contando com diálogos nada expositivos ou muito reveladores, a trama, escrita por Kiarostami, gira em torno de uma jovem universitária chamada Akiko, que é compelida a se encontrar com um simpático/recluso professor e tradutor de livros. Em paralelo, também somos apresentados ao noivo da moça, que desconfia de tudo que ela faz e diz.
Centralizando sua câmera num único ponto e mostrando diferentes situações e personagens ao redor da protagonista (que é perfeitamente apresentada apenas com sua voz), a sequência inicial resume a cartilha que o iraniano utiliza no decorrer de sua narrativa. Com uma elegância singular, Kiarostami posiciona cada personagem da maneira como deve proceder em sua história; e mesmo que não seja revelador no que exatamente está ocorrendo, quem são aquelas pessoas e o que elas fazem, o diretor oferece dicas ao longo de seu primeiro ato, seja numa cuidadosa enxugada de óculos de Nagisa ou numa esclarecedora mensagem durante um trajeto de taxi.
E do mesmo modo que um único gesto de uma personagem praticamente sem importância no decorrer da história de Akiko surge denunciador, outros personagens acabam sendo igualmente aprofundados por Kiarostami – nessa perspectiva, o noivo da protagonista aparece muito mais multifacetado do que exclusivamente uma pessoa ciumenta ou agressiva (como a conversa no carro com o “avô” de Akiko insinua). Ainda que o roteiro tenha uma parcela de contribuição nesses pequenos gestos (o qual enquadro, por exemplo, Akiko tirando o casaco tão somente quando se sente confortável na casa de Watanabe), nada seria possível sem o talento de seus atores.
Nesse ponto, Tadashi Okuno desponta como uma das melhores e mais comprometidas atuações do ano, ao encarnar um senhor extremamente solitário e misterioso – destacando-se, principalmente, em duas cenas: na primeira, no seu contido desespero quando se vê sem saída ao deparar-se com o noivo de Akiko na porta de sua residência; além da tocante cena em que se vê sozinho em sua sala, mais uma vez, solitário e ouvindo Like Someone in Love ao fundo.
Afinal, a bela canção cantada por Ella Fitzgerald simboliza com perfeição a vida daquelas pessoas que aborda: tão desorientados quanto um alguém apaixonado.
Um comentário:
Andrey,
Gosto muito da maneira com que, conforme iluminado por um amigo nosso, as principais ações dos protagonistas parecem ou estar escondidas distante dos olhares do espectador (a ida da jovem ao banheiro) ou apenas serem sugeridos para que possamos criar nossas próprias interpretações (a conversa dela com o namorado na escadaria do colégio).
Na verdade, o que a gente parece estar vendo, a meu ver, é apenas uma distração empregada pelo cineasta que nos distraí daquilo que não nos é mostrado e onde se encontra a chave do filme.
Adoraria discutir com você depois.
Abraços.
Postar um comentário