1 de agosto de 2012

Katy Perry: Part of Me


Idem, EUA, 2012. Direção: Jane Lipsitz e Dan Cutforth. Elenco: Katy Perry, Russel Brand, Justin Bieber, Rihanna, Shannon Woodward, Adele, Jessie J, Rachael Markarian, Mia Moretti, Lucas Kerr, Glen Ballard, David Daniel Hudson, Johnny Wujek. Duração: 93 minutos.

Tanto Never Say Never, do cantor Justin Bieber, quanto Part of Me, da cantora Katy Perry, conseguem ser documentários surpreendentes por fugir de uma abordagem apenas marqueteira (ainda que esteja lá) e explorar os bastidores do estrelato. E se o documentário do garoto canadense julgava mais importante ressaltar as consequências da vida do astro teen nos olhos de quem o cercava; em Katy Perry: Part of me, temos uma cantora segura de seu carisma e talento nos revelando um lado cativante e humano, não fugindo de alguns previsíveis julgamentos e mostrando – mesmo que superficialmente – o preço da fama.

Dirigido pela dupla Jane Lipsitz e Dan Cutforth, em sua segunda parceria, o filme acompanha a trajetória da cantora pop Katy Perry em sua turnê California Gurls. Assim, o documentário aborda não só os shows em si, mas os dramas pessoais da cantora nesses exaustivos 365 dias, além de apresentar rapidamente o início de carreira da artista.

Estabelecendo os fãs da cantora como os maiores líderes da jornada realizada por Perry até então, é curiosa a coesão com que a dupla de diretores aborda essa visão, mostrando também o quanto a artista influencia na vida dessas pessoas e como elas passam a executar suas músicas com sentimento. Além disso, as palavras de Perry surgem bem colocadas neste primeiro momento por justamente demonstrar esse espírito (“eu quero ser uma líder”) e encontram forte ressonância quando a cantora convida os fãs para o palco, numa demonstração profunda de carinho por aquelas pessoas.

Do mesmo modo, o documentário foge um pouco do padrão convencional ao desmistificar a figura de ícone pop representada por Perry na indústria musical atual (note ela passando desodorante antes do show ou na exclamação “estou nervosa”) e aposta em cenas extremamente intensas emocionalmente e as quais a própria cantora se autoavalia. Aliás, é interessante observar como em determinado momento nos damos conta de que algumas escolhas de Perry são justificáveis pelo fato de ela se portar ainda como uma adolescente, para logo depois a própria dizer: “Pareço ter 16 anos e ajo como se tivesse 16 anos!”.

Nesta análise, a forte influência do cristianismo em sua família acaba se tornando a explicação mais óbvia e interessante do longa-metragem. E, mesmo que os diretores nunca tentem oferecer uma profundidade maior nas músicas atuais de Perry, que nascem como frutos de uma infância extremamente conservadora e reprimida, estão no contexto. Ao mesmo tempo, o filme também ensaia uma crítica à própria indústria quando aborda as primeiras tentativas de sucesso de Katy e mostra como o sucesso só foi possível devido ao modelo construído nela (“Lugar de material poético é no fundo da gaveta!”), porém nunca se mostra tão corajoso.

Em contrapartida, o documentário também acomoda uma grande parcela de erros, principalmente no primeiro ato, quando os diretores julgam muito mais importante mostrar Perry como uma criatura especial e política – chegando a mostrar a descartável cena em que a cantora toca na barriga de uma gestante ou na visita a avó que é totalmente sem propósito. A dupla de diretores, ainda, se mostra sem qualquer inspiração quando volta a usar as redes sociais da mesma forma que fora utilizada em Never Say Never – filme que curiosamente foi produzido pelos dois.

E se os erros residem quando Katy Perry é mostrada de forma caricatural, criando quase um personagem fictício, são nos momentos humanos que o documentário ganha tons mais interessantes e vivos. Neste ponto de vista, usar o romance da artista como pano de fundo para desencadear o momento mais comovente do longa-metragem – o show em São Paulo – se mostra uma atitude corretíssima e que se torna ainda mais atraente quando percebemos que ela não era esperada pelos envolvidos. Aliás, não se pode deixar de citar a competente e eficiente transição que os montadores fazem entre músicas e depoimentos, colaborando para o momento em que a artista canta The One That Got Away e que ecoa uma sentimentalidade ímpar. Além do mais, o romance entre Katy e Russel é sempre orientado de forma linear – observe, por exemplo, que se temos Katy cantando E.T. quando está apaixonada, ela muda o tom quando canta Not Like The Movies, antes de chegar ao momento do show no Brasil.

E mesmo com suas falhas nítidas e pontuais, Katy Perry: Part of Me se sai muito mais do que algo feito apenas para obter lucro para a artista. Compartilhamos as emoções da cantora em determinados momentos e nos sentimos íntimos de sua jornada no final do longa-metragem. Perry com seu carisma nos leva para um lugar que não é exclusivo para fãs e com isso, quem sabe, talvez acabe fazendo novos.

2 comentários:

Eduardo Monteiro disse...

Como virei um KatyCat nos últimos dias (devo estar cantarolando uma música dela nesse instante, sem querer), sou obrigado a corrigí-lo: o nome da turnê é California Dreams.
Porra, nem acredito que sei disse sem sequer ter usado em meu próprio texto.
Aliás, pegamos em pontos semelhantes, mas como publiquei depois, as acusações de plágio recairiam sobre mim. Hahahahahaha
Quando li "Pareço ter 16 anos e ajo como se tivesse 16 anos!", lembrei na hora que ela fala isso mesmo e fiquei em dúvida se ela falava a frase que eu mencionei. E lembrei que ela fala as duas mesmo, ou seja, ela realmente enfatiza essa infantilidade que sabe que tem.

Márcio Sallem disse...

Muito bom o seu texto Andrey.
O detalhe do desodorante foi algo que deixei anotado, mas acabou não surgindo no "corte final" da crítica.
Agora temos um ponto de discordância fundamental: eu gostei mais da abordagem de Katy Perry, a personagem, do que do ser humano. A meu ver, fica fácil se relacionar com aquela cantora amalucada, exibida e carismática, mas não com a mulher detrás da maquiagem.
Há bons momentos, sim, mas acho que as entrevistas parciais não acrescentam muita coisa (exceto quando conseguimos relacionar sua rebeldia com a proibição imposta pelos pais religiosos; ou o olhar de desdém e tristeza ao vestido de noiva da irmã).
Mas, é um bom filme (e surpreendente), passei a olhá-la diferentemente e, mesmo que não tenha virado KatyCat como o Eduardo, não mudo mais a rádio nas suas músicas (não mudava antes hahaha, foi só uma frase de efeito).