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Baby Driver, Inglaterra/EUA, 2017. Direção: Edgar Wright. Roteiro: Edgar Wright. Elenco: Ansel Elgort, Jon Hamm, Jamie Foxx, Lily James, Eiza González, Jon Bernthal e Kevin Spacey. Duração: 1h52min.
A
maneira como reproduzimos contextos no cinema é fascinante. Quando precisávamos
criar empatia com personagens violentos, por exemplo, tratávamos de
humanizá-los o mínimo que fosse para que não precisássemos acompanhar um
canalha completo em sua missão nos submundos do crime. Scarface é um exemplo
claro e, inclusive, citado em cursos de cinema, pois atribui algum tipo de
caráter ao protagonista na primeira cena do filme, quando ele se sente acuado e
fala sobre a irmã. O que você vê depois, torna-se uma ilusão narrativa, porque
você passa a achar que só você, o espectador, sabe quem é o verdadeiro Tony
Montana. Aquele sujeito que gosta da irmã. Ele não é completamente desumano. Há
um coração. Esse é o princípio da empatia no cinema. Quando pegávamos os
assaltantes sendo caracterizados como mocinhos, a exemplo de Onze Homens e um
Segredo, ainda assim tínhamos uma questão imprescindível para que torcêssemos
para os anti-heróis: eles roubavam cassinos, que supostamente eram gerenciados
por aproveitadores e criminosos, portanto eles só estavam roubando de quem
rouba.
Essa
é uma das falas do personagem de Jamie Foxx, em Baby Driver (Em Ritmo de Fuga),
que atiça a curiosidade para o contexto do filme de Edgar Wright. "Nós
viemos pegar o que é nosso. Ele nos roubaram. E agora queremos isso de
volta", Bats expõe. O pensamento de que estamos a bordo de um veículo que
transgride leis, foge de autoridades, mas assalta o próprio governo, passa a
nos sugerir um novo contexto para nossa empatia, onde o transgressor passa a
ter nosso carinho pois também gostaríamos de estar provocando o governo em atos
rebeldes e pegando um dinheiro que é desviado para outros fins que não a nossa
assistência social. Assim, Wright não só brinca com esse caráter paradoxal,
como também se diverte ao introduzir esses personagens no mundo de Baby Driver
– Buddy, Darling, Baby, Bats, Doc e Griff.
Mostrando
que também é um diretor talentosíssimo, o inglês desenvolve o plano sequência
inicial com uma habilidade invejável, ao nos apresentar o nome do personagem
pela primeira vez – e perceba, desta forma, como o diretor vai e volta do
prédio onde Baby está, como se estivéssemos na perspectiva de um volante. Mais
belo, é como Baby é apresentado para nós, pouco a pouco, sem que as nuances
sejam explicadas didaticamente. Ao nos apresentar a origem de sua história com
carros, por exemplo, avaliamos que o seu perfeccionismo por música e pela
técnica provém da morte da mãe ao volante de um carro, enquanto ele escutava
música para não ouvir as brigas dos pais. Desde então, Baby fugia. Não ligando
para a morte, já que a adrenalina vinha de estar sempre perto dela e,
consequentemente, perto da mãe, o protagonista se esconde atrás de dance moves
e piruetas para nunca se sentir parado. E os únicos momentos que Baby
confraterniza a música com alguém é para dois dos personagens mais importantes
do longa: a primeira vez, Buddy (Jon Hamm, fabuloso) pega um dos fones da
orelha dele para participar do momento que ele vive; no outro, Baby dá para
Debora um de seus fones para ela confraternizar com ele aquele instante.
Assim,
quando se torna um coadjuvante da história, um carona, Baby para de fugir. Ele
entrega o volante para Debora e se rende.Uma forma de deixar claro que Wright
não é um diretor que pretende apenas ser descolado. Ele é alguém que sabe
exatamente o que faz.