26 de julho de 2013

Turbo

Idem*, EUA, 2013. Direção: David Soren. Roteiro: Darren Lemke, Robert D. Siegel e David Soren. Elenco de vozes: Ryan Reynolds, Paul Giamatti, Michael Peña, Samuel L. Jackson, Luis Guzmán, Bill Hader, Snoop Dogg, Maya Rudolph, Bem Schwartz, Richard Jenkins, Ken Jeong, Michelle Rodriguez, Mike Bell. Duração: 96 min.

A nova animação da DreamWorks, Turbo, basicamente se volta para o que fez a Pixar ganhar tanto apreço e espaço conquistado na década passada: sensibilidade. Uma premissa que já percorreu tanto os sonhos de Remy em Ratatouille quanto os de Lightning McQueen em Carros – a oportunidade de ser algo maior do que a realidade espera de você. No filme de Remy, por exemplo, observávamos um rato querendo ser um chefe de cozinha, alguém desestimulado por sua classe e que encontrava na amizade de Linguini uma oportunidade para realizar os seus sonhos mais impossíveis.

Turbo, por sua vez, conta a história de um caracol que tem o desejo de ser o mais rápido do mundo e participar da Fórmula Indy. Estimulado pela figura midiática de seu maior ídolo, Guy Gagné, ele passa a achar que é possível sua força de vontade ultrapassar o seu físico; no entanto, numa virada do destino, surpreende-se ao ganhar habilidades que realmente o tornam o caracol mais rápido do mundo, o que o faz cativar o mundo e ter uma chance na tão sonhada Fórmula Indy.

O estreante e interessante diretor David Soren também conta com a figura humana presente para dar sustentabilidade ao sonho do caracol. Theo, seu nome original, e Tito ainda buscam encontrar seu lugar no mundo, onde devem se encaixar. Ambos se complementam. Já Gagné, de figura incentivadora e querida publicitariamente, transforma-se em um grande vilão egocêntrico – uma perfeita análise de muitos dos nossos próprios heróis. Talvez o que o próprio Gusteau fosse se mostrar caso o conhecêssemos no universo habitado por Remy.

Numa época em que a Pixar tenta tanto retomar o seu lugar ao pódio, resgatando histórias conhecidas para tentar retomar o que a fez tão prestigiada, é a DreamWorks, pelo segundo ano consecutivo, que traz uma animação tão competente para adultos quanto para crianças.



*Crítica publicada originalmente no Diário Catarinense.

                                

10 de julho de 2013

O Homem de Aço

Man of Steel, EUA/Canadá/Inglaterra, 2013. Direção: Zack Snyder. Roteiro: David S. Goyer, baseado em uma história de Goyer e Christopher Nolan e nos personagens de Jerry Siegel e Joe Shuster. Elenco: Henry Cavill, Amy Adams, Michael Shannon, Diane Lane, Russell Crowe, Christopher Meloni, Kevin Costner, Antje Traue, Harry Lennix, Richard Schiff, Ayelet Zurer, Cooper Timberline, Dylan Sprayberry, Laurence Fishburne. Duração: 143 min.

Muito mais do que a incansável pergunta que filmes com temática extraterrena geralmente assumem para si, a famigerada interrogação de estarmos sozinhos no universo ou não, a busca pela sociedade utópica, em qualquer parte, é algo cada vez mais instigante e admirável. Como se sentenciasse que a procura pela paz não é uma exclusividade humana, os melhores filmes do gênero partem da premissa da comunicação serena entre os povos e a ambição de uma sociedade universal que concilie as diferenças em busca de pontos em comum: seja através da matemática, da música ou dos símbolos oferecidos. Ainda que costume ser taxado de um tipo de ressurreição de cristo, como se ele anunciasse a segunda vinda, Superman aspira ao que os povos desse tipo de temática almejam: um lugar melhor. Pode ser visto como algo demasiadamente clichê e insustentável ou, até mesmo, ingênuo e pretensioso, mas é coerente.

E o que pode ser mais tocante do que um alienígena, que tem a formação longe de suas raízes, pais e sociedade, percorrendo o globo atrás de sua verdadeira natureza? Uma busca existencial que supostamente nunca terá fim, porém, tão pertinente quanto à gênese humana e sua ciência. “Eu não quero ser”, afirma o personagem construído de forma talentosa por Henry Cavill quando seus pais apontam o que há de especial nele e o que se espera de seus talentos. Kal-El vive perdido entre dois mundos: a sua inalcançável civilização e o que poderia ter vivido com seus pais biológicos, que agora é apenas um sintoma em sua genética, e sua vivência terrena com os pais adotivos que geraram a sua fé e condição humana.

Essa dicotomia, de homem e sua natureza, não é exclusiva do pensamento do protagonista do filme, tampouco; Kripton é um lugar habitacional mágico e aspirado – onde as pessoas daquele lugar encontraram um equilíbrio entre vida, tecnologia e ambiente natural. Os efeitos especiais utilizados no primeiro ato são complementares a essa filosofia. O grande obstáculo de Kripton está exatamente no que foi criado: o máximo que havia sido alcançado. Passou a ser um lugar em que o estado de buscar passou a ser o estado de ser. Não existiam mais pessoas que poderiam mudar algo que não havia como ser mudado, apenas classes pré-fabricadas e automatizadas, sem a vida como a conhecemos. Sob esta ótica, Zod acreditou que apenas um golpe de estado devolveria uma clareza para Kripton sobre as coisas e um novo direcionamento – algo censurável, claro, mas que deu início a muitas “revoluções”. O general é um robô, não é natural, foi “esculpido” para ser uma espécie de guardião de seu planeta. Shannon esbraveja por seu povo, queima populações para chegar a uma nova raça e só descansará de seu código quando abraçar a morte. Jor-El é exatamente seu oposto. Mais “humano”, ele também acredita que Kripton está chegando ao seu fim, mas ambiciona uma nova era – “nunca o veremos andar, mas nossas esperanças e sonhos vão com você”. O sonho do general explode junto com seu planeta, o de um pai está percorrendo um novo caminho.

Kal-El é uma soma benéfica de duas diferentes raças. Obteve a sorte de cair em uma fazenda e ter pais adotivos que lhe formassem um caráter humilde, assim como o seu pai verdadeiro desejaria. Ele passa a descobrir seus poderes aos poucos, salvando, inclusive, seus próprios agressores do colégio em um desastre. Para ele, como lhe foi ensinado, qualquer vida é digna. “O mundo é muito grande? Faça-o pequeno!”. Os flashbacks de sua infância resgatados pelo montador David Brenner também são suficientemente eficientes para mostrar essa dubiedade nos sentimentos de nosso protagonista e apontar o porquê de estar naquela busca. Kevin Costner, por exemplo, é tão edificante para quem viria a ser o Superman como o próprio Jor-El. Ele não pestaneja em salvar qualquer tipo de vida (aliás, um parêntese curioso para a retomada da saga) e se sacrifica pelo próprio filho – e aqui cabe ressaltar dois diálogos intimistas em que o ator transborda sentimentos: em passar que talvez ele devesse deixar pessoas morrerem e que Clark é o seu filho.

Por outro lado, esse argumento social e humano é perdido no instante em que Snyder começa a fazer esforços para cumprir o orçamento milionário que tem em mãos, como denuncia o literalmente explosivo terceiro ato. Dono de cortes tão rápidos que a ação fica quase impossível de ser conferida e usando da mesma escola de Abrams ao conferir flares a todo o momento na trama, o diretor avança rápido demais na construção de alguns relacionamentos e abusa novamente em tratar Superman como um salvador católico. Kal-El tem trinta e três anos, posiciona-se como se estivesse crucificado assim que ouve que pode salvar todos os humanos e tenta se passar por um deles. O seu relacionamento com Lois passa a ser plausível apenas por uma questão de confiança e conhecimento prévio da história original – Kal-El encontra na personagem uma força feminina gigantesca, mesmo que ela pareça pequena quando está com ele, não fazendo jus a esse fator. O beijo trocado por ambos nasce tão robotizado e sem significado quanto uma vida nova surgia na Kripton que conhecemos. E, se a fotografia de Amir Mokri só dá lugar ao branco intenso e ofuscante, a trilha sonora de Zimmer é mais uma vez digna de aplausos a balancear cada momento vivido pelo personagem e não deve em nada para a trilha que Williams imortalizou.


Ainda, é notável a insegurança que Snyder possui em trazer uma trama menos explosiva e mais intimista para um filme que conta com um homem imbatível. E é por isso que ressalvo a escolha dele para um retorno à saga do Superman. O charme de O Homem de Aço não está na força de seu personagem, mas em sua dinâmica sentimental: como alguém imbatível pode ser dono de uma solidão eterna? Ele está buscando o seu lugar ao mundo, forçando-se a se adaptar a um sistema que já está pronto – como todos nós fazemos e como as coisas eram arranjadas em Kripton. O coronel do ótimo Christopher Meloni tem a mesma vocação do general de Shannon, ambos apenas pensam em defender os seus povos e suas raízes – sacrificando-se por elas em seus percursos. Não se pode dizer que não é um começo pretensioso e potencialmente bom para o herói, mas certamente não se pode jogar tudo fora apenas para corresponder às expectativas de um público que apenas quer ver sangue. Isso já é comum em nossa própria realidade.  

                                 

4 de julho de 2013

Meu Malvado Favorito 2

Despicable Me 2, EUA, 2013. Direção: Pierre Coffin e Chris Renaud. Roteiro: Ken Daurio e Cinco Paul. Vozes: Steve Carell, Kristen Wiig, Benjamin Bratt, Miranda Cosgrove, Russell Brand, Ken Jeong, Steve Coogan, Elsie Kate Fischer, Dana Gaier, Nasim Pedrad, Moises Arias, Pierre Coffin. Duração: 98 min.

Não há como negar que existe um argumento curioso e que, caso fosse bem trabalhado, poderia render um grande filme em Meu Malvado Favorito. Um vilão que se apaixona pela ingenuidade de suas filhas e transforma-se em mocinho: como não comprar a ideia? Em um mundo em que nos acostumamos a observar o contrário, o conceito é no mínimo agradável e instigante. É uma pena, portanto, que a única coisa que se pode perceber na trama de Meu Malvado Favorito 2 é uma imaturidade atrapalhada que joga todo o seu potencial ladeira abaixo e se restringe a gracinhas deslocadas.

Escrito por Ken Daurio e Cinco Paul, a história acompanha Gru, que tenta viver em paz com suas três filhas e sacrifica os seus planos maléficos para tentar iniciar um negócio de geleias e gelatinas. Convocado pela liga antivilões para investigar um novo supervilão, Gru passa a se relacionar com a agente Lucy, ao mesmo tempo em que reencontra alguém que supostamente era para estar morto.

Previsível em cada passo que toma, iniciando com uma gag visual ultrapassada de alguém no banheiro, nem mesmo a direção de arte de Eric Guillon procura sair do terreno óbvio que a trama embarca – a casa de Gru é um claro exemplo. O roteiro, nesta linha, é ainda pior ao criar situações incabíveis e diálogos absolutamente repugnantes que tentam extrair graça de obesidade, flatulências e da imaturidade de crianças frente a relacionamentos. Assim, basicamente construído por frases dos anos 50, Daurio e Paul ainda acham hilário brincadeiras com nomes de personagens – o que não os distancia nada de Hubert, Marcelo Madureira e sua trupe.

Além disso, guiando-se claramente no apelo dos minions, Conffin e Renaud não escondem o “dinheiro fácil” que veem nos personagens e chegam a colocá-los em dois números musicais no terceiro ato. Igualmente, ambos tentam eclipsar a falta de uma história – já que tudo é descoberto em menos de dois minutos e a razão de El Macho nunca fica clara (a não ser que você considere “conquistar o mundo” o bastante) – investindo em alguns exercícios de estilo bobinhos para manter o público entretido. E se em um instante tentam passar uma aura misteriosa inexistente para a obra, o que dizer sobre a cena em que um dos pequeninos é sequestrado enquanto está limpando a casa; noutro, eles tentam dar uma dinâmica através de closes constantes e até do uso subjetivo da câmera.

Dirigindo-se para onde toda a animação desprovida de sentimentos ou grandes ideias se encaminha, um relacionamento amoroso para seu protagonista, Meu Malvado Favorito 2 é mais uma animação que se empolga muito mais com seus coadjuvantes do que com o seu argumento. Algo que, apesar de consciente, destrói ainda mais as chances de ver o potencial dramático de Gru.

                                      

1 de julho de 2013

Os Amantes Passageiros

Los amantes pasajeros, Espanha, 2013. Direção: Pedro Almodóvar. Roteiro: Pedro Almodóvar. Elenco: Antonio de la Torre, Hugo Silva, Miguel Ángel Silvestre, Laya Martí, Javier Cámara, Carlos Areces, Raul Arévalo, José María Yazpik, Guillermo Toledo, José Luis Torrijo, Lola Dueñas, Cecilia Roth, Paz Vega, Blanca Suárez, Penelope Cruz e Antonio Banderas. Duração: 90 min.
Após uma bem sucedida estreia no gênero de terror com seu ótimo A Pele que Habito, chega a ser penoso ver Almodóvar tentar retomar sua zona de conforto com uma comédia escrachada e sem nenhum apelo emocional. Feito como um produto “a toque de caixa”, Os Amantes Passageiros é um longa-metragem insosso, imaturo e sem qualquer inspiração, que parece ser produzido apenas para pagar dívidas provenientes de algum mau negócio que seu diretor realizou no último ano.
Escrito pelo próprio Almodóvar, a história se passa dentro de um avião que está andando em círculos por conta de uma falha mecânica. Nesta perspectiva, acompanhamos um grupo de personagens que tenta descobrir o que está acontecendo e acredita estar perto da morte, assim como os relacionamentos tumultuados entre os comissários de bordo e pilotos.
Confuso até quanto ao cenário da narrativa, o diretor também nunca decide se focará no drama de seus passageiros ou nos estereótipos ou até mesmo em vidas interligadas – assim sendo, o terceiro ato acaba como uma soma bagunçada de todos esses fatores: há as ligações confessionais que são ouvidas por todos os passageiros, um absurdo e estúpido número musical, além – é claro! – de mudanças de vida por conta de uma viagem turbulenta. Almodóvar nem esconde o roteiro preguiçoso ao colocar todos os passageiros da classe econômica dormindo para não gastar muito mais tempo do que deveria ou “prejudicar” a “ligação” de seus três atos.
Além disso, ele parece perdido em como guiar o seu nonsense. Embora seja eficiente no tolíssimo número musical, encontra dificuldades em enquadramentos simples ou que sugira algo da trama – desta maneira, aposta em closes deslocados que tentam criar gags visuais espertinhas e infantis (note a simulação no começo da viagem) e planos inclinados que não têm motivo aparente. Ao mesmo tempo em que, crente que sua “história” não é suficiente para 90 minutos, retoma a ação para a vida pessoal de alguns de seus personagens, como é o caso do ator e seu relacionamento com Ruth, que é culminado em uma das piores sequências da filmografia de Almodóvar.  
Criando um clímax que consegue ser mais intragável do que o relacionamento do copiloto com um comissário de bordo e do que as piadinhas politicamente incorretas presentes a todo o momento, Os Amantes Passageiros assusta pela seriedade com que os envolvidos tentam se expressar, como se tudo aquilo fosse bastante original. O resultado assustador acaba transformando uma obra simplória e tola em algo ofensivo e indefensável.